Especial: 
Populares do Ritmo

Saudade daquele som
e ritmo bem popular

jornal Turma da Barra

 


Os Populares do Ritmo
Praça Melo Uchoa - década de 70

*por Álvaro Braga

            O conjunto Os Populares do Ritmo entrou para a história de Barra do Corda, quando iniciou suas atividades, em meados dos anos 60. Tudo começou com a idéia de Edson Bílio e Cipriano, de fazerem um conjunto musical. Jaldo Pereira Santos e a esposa Antonia, em comum acordo com o maestro Joaquim Bílio, escolheram o nome daquele grupo musical, formado por um grupo de rapazes sonhadores, que iria se tornar legendário.
            Jaldo, vendo a garotada se esforçar para tocar alguma coisa resolveu investir na compra de instrumentos musicais. Visionário de carteirinha, Jaldo Santos vislumbrou ali uma oportunidade de proporcionar algum meio de vida para a garotada, já que não havia oferta de emprego em Barra do Corda.
            Os rapazes, na época com 17 ou 18 anos, vendo alguns artistas que visitavam a cidade, como João Pojuca, de Teresina, Barbosa Fubó Show & Bossa, com o conjunto O Sultão, Os Muggs e outros, que vinham de Fortaleza, tomaram gosto pela coisa. Pegaram ali um violão, Cipriano de baterista, e começaram a ensaiar.
            Como possuía boa condição financeira, Jaldo disse: - Vamos fazer uma coisa profissional! E comprou uma guitarra e um contrabaixo. No início o pessoal fazia troça, mas depois de algum tempo, foram vendo que a turminha levava jeito pra coisa e pararam de desdenhar.

Primeiros Integrantes

            A primeira turma contava com os seguintes integrantes: Joaquim Bílio, Juarez Bílio, Edson Bílio, Zuza Bílio, Manoel Clemente, Cipriano, Artur Galvão, Joacir, que tocou um tempo e depois foi para o exército. A Francisca entrou depois para cantar.
            É o Edson Bílio quem conta: “Carro nunca tivemos. Os carros eram fretados. Tinha a Kombi do Jaldo, e a C-10 do Elton, que era casado com uma prima do Tatá.”
            Durante muito tempo, o braço direito de Jaldo foi o Jacinto, um ex-malabarista do Circo Ala-kazan, que casou com uma barra-cordense e por aqui ficou por muito tempo. Para transportar os músicos, equipamentos e os instrumentos nas viagens, Jaldo encarregou o Jacinto de tomar conta de uma C-10 azul que ele possuía. Ele inicialmente foi contratado como baterista dos Populares.
            O pequeno conjunto, em seus primeiros tempos, tinha mais “sopro” do que qualquer outra coisa, o que levou o maestro Moisés da Providência Araújo a colocar o apelido de “Furiosa”. E ele não estava errado, pois tecnicamente, no jargão dos músicos, essa palavra significa uma pequena orquestra de instrumento de sopro. Jaldo não gostava do apelido, queria que chamassem pelo nome real de “Os Populares do Ritmo”.
            José Edno lembra que antes do Arnóbio Queiroz, quem colocava o prefixo musical no Guajajara, anunciando a festa dos Popilas, era o Tomás Queiroz. E continua: "Nunca esqueci daquela época boa, nos anos 60, quando se apresentava na Barra o Nonato e Banda, os Muggs, como lembrou o Heider da dona Zelinda.
            Relembra também que uma vez aconteceu no Guajajara um show que entrou para a história, pois a festa, que durou a noite toda foi tocada por apenas dois músicos, o Cipriano na bateria e o Piska, filho do Dr. Clovis, na guitarra. Foi uma coisa impressionante a capacidade daqueles dois, de levarem no braço, sozinhos, uma festa inteira. Os Populares gostavam muito de tocar a música Natali, dos Fevers: "Tudo é triste em meu viver / não consigo mais te olhar... / Natali, Natali...É rapaz, dá uma saudade danada.
            Ao falar dos Populares, Édno sugere que o conjunto devia se reunir, vez por outra. Lembra também com tristeza, que pelo final dos anos 80 e início dos 90 ele como Venerável, da Maçonaria, “contratei os Populares do Ritmo para tocar em todas as noites de Carnaval e para nossa surpresa, não foi quase ninguém, pois ali se iniciava o carnaval de rua na praça Melo Uchoa, de graça. Então marcou muito, pois se encerraram dois ciclos ao mesmo tempo, o da Maçonaria, como clube carnavalesco e os Populares do Ritmo.”
            Acrescenta José Édno: "A nossa patota, que admirava os Populares, era formada pelo Zé Arildo, Célio, Ivan Pacheco, o Gilson, o pessoal todo que jogava bola, o Galvão do BEC e seu irmão Carlos, e muitos e muitos outros. Foi um tempo muito bonito, da gente, só nosso. Só de lembrar dá uma saudade danada."
            A idolatria em torno dos Popilas e do Guaja, como era também conhecido o clube Guajajara naqueles anos dourados era tanta que Gilson Pacheco não perdia as férias de julho, onde havia a festa de aniversário do Guaja, que era invariavelmente feita com Os Populares. Gilson vinha de Brasília a Barra do Corda, fizesse sol ou chuva, de automóvel ou de ônibus, para estar presente na festa do Guaja, realizada a cada 13 de julho. Gilson gostava tanto daquela festa que chegou a presentear com um disco LP (long playing) com as “14 Mais”. A intenção era que o Conjunto se atualizasse e tocasse as músicas que estavam estourando nas paradas de sucesso pelo país afora."
            O economista Mário Hélder relembra com nostalgia: “O entusiasmo com que tocava Os Populares do Ritmo era uma coisa impressionante. As suas “tertúlias” eram de primeira e me fizeram muito bem, pois gostava muito de dançar. Gostava tanto do Guajajara, ao som da “Furiosa”, que acabei me tornando presidente do Clube, em 1987.
            Anizinho Queiroz rememora que, aos sábados e domingos, seu primo Arnóbio, ia bem cedo ao Guajajara colocar na aparelhagem de som uma música dos Incríveis, que era o prefixo musical que servia de chamada característica, para anunciar que ia ter festa. Todo mundo então ficava sabendo que ia ter Os Populares do Ritmo no Guajajara Clube.
            Foi um tempo muito bom que marcou várias gerações. Naquela época as opções eram poucas. Tinha o Bombardo, aí apareceu o Mete-Mete, que no início era o Bar Encontro dos Amigos. Ali, na descida, tinha um quiosque de madeira que vendia umas garrafinhas de cachaça com tira-gosto de caju para a turma que ia descer por água. O pessoal falava: "Vamos meter uma quente", dai o apelido da Peixaria. Depois inventaram o Estancia Recreio que foi batizado de Tira-Tira. Havia a boate O Portão, do Carlão, depois o bar Colonial e a churrascaria Sete Rodas. Os Populares tocaram em todos esses lugares e alegrou uma geração inteira. 
            Rubem Milhomem analisa: “O conjunto nasceu para tocar nas chamadas ‘festas da sociedade’, embora com o tempo tenha assumido a vocação para atender o povão mesmo. Quando foi criado, ainda persistia, entre as cabeças pensantes e endinheiradas da Barra, a idéia de que a cidade deveria ter um clube que prestasse, animado por músicos próprios (na década de 60 foi o Maranhão Sobrinho; na década de 70 foi o Guajajara; na década de 80 a Maçonaria); a partir da década de 90 virou bagunça, e também a Barra passou a não ter mais gente seriamente engajada com a nobreza da diversão, tudo virou simples comércio, morreu o idealismo... As pessoas zombavam que zombavam dos Popilas, foram muito injustas com eles. A realidade é que o conjunto era aquilo que era possível naquele tempo. E, sem ele, tenha certeza que a história da noite e da diversão na Barra teria sido outra, bem mais sem graça”.
            Depois foi mudando, mudando, até que se tornou um conjunto “indo e voltando”, ou seja, de gabarito, reafirma Edson Bílio.
            No princípio, o conjunto tinha uma fama não muito boa, pois alguns o classificavam injustamente de ser “de segunda”. Com o passar do tempo, a qualidade deles falou mais alto, e os mesmos que olhavam com certo desdém tiveram forçosamente que rever seus conceitos enferrujados.
            Os Populares tocaram muito no Guajajara Iate Clube, onde tinha um público cativo e fiel. Depois com a evolução, adquiriu instrumentos novos e passou a excursionar, já trabalhando profissionalmente por todo o interior maranhense, indo a São João dos Patos, Dom Pedro, Presidente Dutra, Colinas, e outras cidades do hinterland (interior) maranhense.
            Ficaram na história as noites memoráveis, quando Os Populares do Ritmo se apresentavam no “Guajajara”, e o Manoel Clemente, com os olhos esbugalhados, envergando o seu trombone, executava a famosa “Na onda do berimbau”. Era uma festa só, a alegria dos foliões e dançantes era contagiante. Coisa que emociona quem relembra aqueles dias felizes. Não tem jeito.
            Como esquecer que “Os Popilas” eram também o conjunto de gala da Maçonaria, animando o 31 de dezembro e os carnavais? Com eles, sobreviveu durante anos o carnaval de marchinha, que hoje só figura em alguns blocos carnavalescos da Barra. Uma pérola do repertório carnavalesco - "Meu cavalo tá cansado/ já não pode galopar/ dizem que perdeu as patas/ cavalgando na carreira". Outra: "Eu quero me trepar no pé de coco/ eu quero me trepar para tirar coco/ realmente eu quero tirar o coco/ pra saber se coco é oco/ pra saber se o coco é oco".
            Uma vez, a troupe saiu para Goiás, por volta de 1968, e ali, deu-se um fato interessante: No rio Tocantins, o barco que ia o conjunto, parou o motor no meio do rio e ficou à deriva, ao sabor da sorte. Se não fosse um rebocador que ia passando e o pessoal deu com a mão, tinha se espatifado todo em uma ilha e nos precipícios e grotões que tem por lá, pela altura do trecho entre Tocantinópolis e Porto Franco.
            Edson Bílio relembra: “O finado tio Juarez, que era muito católico, além de cego, ficou rezando, pedindo a Deus o salvamento de todos. Ai apareceu duas balsas, com um motor V-1 de um lado e do outro, ai salvou-se todo mundo.
            As músicas executadas eram sempre músicas atuais para a época, tocadas pelos outros conjuntos do momento, como as músicas da Jovem Guarda, Vanusa, The Fevers, Renato e seus Blue Caps, Roberto e Erasmo Carlos, José Roberto, Beatles, músicas internacionais de todo tipo. O que tivesse em evidência a gente tocava”.
            E continua Edson Bílio: - “Lembro que tio Jaldo uma vez cismou, que queria por que queria, que tocássemos uma música do Lindomar Castilho. Nós falamos com ele que aquele tipo de música, brega por excelência, não se harmonizava com o nosso estilo de músicas, bem jovem, prafrentex, no dizer da moda.
            Combinava mais com o estilo da M-Som 6, do Mandu, que uma vez trouxe o rei do brega Maurício Reis, cantor de Verônica, pra cantar na Toca do Pajé, na Altamira.
            As roupas usadas eram de tergal, helanca, nycron. Nós éramos livres para escolher a própria roupa. Aqui e acolá algum componente da banda usava um macacão. As calças jeans já existiam, mas tinhas outros nomes, como: Lee, U.S. Top, Topeka. As camisas geralmente eram coloridas, de seda estampada, de listras, de bolinhas, xadrez, e ainda tinha o pano “volta ao mundo”, transparente.
            Depois veio a mesa de som. Foi comprado um equipamento atual, já que nossa música era destinada aos jovens. Tudo no estilo Tremendão.
            A banda ensaiava quase todo dia. Quando estava bem afinada, passava a ensaiar de duas a três vezes por semana. Passamos a ensaiar nas garagens da Sucam e galpões da prefeitura que o Fernando Falcão cedeu pra gente. O prefeito Fernando incentivou bastante os Popilas. O Jaldo também teve um clube ali pelas Catingueiras perto do antigo Hospital Acrísio Figueira, mas só ensaiamos por lá talvez uma ou duas vezes. Ali perto tinha o antigo bar Café Filho, do Mororó.”
            Vários outros locais foram escolhidos para ensaio, como por exemplo, o local onde funcionava a farmácia de Jaldo Santos. Acrescente-se que aquele barulho desordenado dos ensaios ecoando pelas casas e quarteirões do centro incomodava as famílias tradicionais, que queriam era sossego.

            Outros integrantes
            Depois que Edson Bílio saiu do Conjunto veio o João Pinheiro, tecladista, o João (John) que atualmente dá aula prática de violão na escola de música; O Paulo Mandioca; O Agamenon, que veio de Governador Archer, era da época do Edson, que era o guitarrista e ele o Agamenon, o baixista; O Zé Carmélio foi bem antes. Tinha também o Cabo Tiago, baixista, que era do 1º BEC – Batalhão de Engenharia e Construção.
            O conjunto tocava demais a música “Os milionários”, dos Incríveis, que era sucesso e foi muito pedida. O Cipriano era um bom baterista. Sobre ele tem uma história interessante. Havia um rapaz que era organista da Igreja, que fazia dramaturgia. Ai o Zé Carmélio que tinha uma “Boca de Ferro” (amplificadora) chamada A Voz do Sertão, chamou ele pelo som, pelo nome com o qual era conhecido, Raimundo Nonato Oliveira ou Nonatinho, aí o Edson pediu pra chamar ele de Cipriano, que era o pai dele, e a partir daí então, pegou o apelido.
            Os Populares do Ritmo tiveram ainda o apelido carinhoso de “Os Popilas”, além da já mencionada alcunha de “Furiosa”. Um outro apelido que recebeu, não era tão edificante. Celso Miranda conta que seu pai, Maneco Miranda, ao presidir o Guajajara Iate Clube, falou em uma roda de amigos: “Os Populares do Ritmo deveriam se chamar *Os Químicos*, pois, segundo ele, conseguiam transformar música em merda...”
            Outro fato é que, quase todos os componentes da Banda de Música Moisés da Providência Araújo passaram pelos Populares do Ritmo em épocas distintas, a saber, dentro do período de 1964 a 1992: Joaquim Oliveira Bílio, Juarez Oliveira Bílio, Ilmar Silva de Oliveira, Paulo Mendes Domeciano, Jacinto Alves de Sousa, Francisco Morais Sousa, João Nava Vidal, Sebastião Artur Galvão, José Araújo Bezerra, Edson Oliveira Bílio, José Carmélio Araújo, Raimundo Nonato de Oliveira, Raimundo Fernandes Oliveira.
            Nos anos 80, nas tardes de domingo passavam verdadeiras multidões para a Peixaria Mete-Mete, no Sítio, na qual os Popilas tocavam, como conjunto oficial da festa. Eram senhoras e senhores casados ou solteiros e, sobretudo, de todas as idades. Naquela época todos iam para os mesmos lugares, e o point Mete-Mete, também chamado “Balneário”, ficava lotado, do Porto do Lau ao Pintinho.
            Os Popilas começavam a tocar no Mete-Mete ali por volta das 14h e iam pela noite adentro. Teve um dia que foi parar na madrugada, por volta de 1h30. Da minha casa eu escutava os reggaes, os forrós (daqueles ligeiríssimos, haja fôlego), as serestas (- "Maaaaaaaaaaria Heeeeeeelena és tu/ a minha inspiração!"), sem contar as lambadas.
            Haviam músicas lentas, românticas internacionais, Pholhas (My Mistake, Forever), Skorpions (Still loving you, Love of my life), daquelas de dançar agarradinho, rosto colado, com o suor dando no meio da canela, naquele calor do cão, naquela coreografia em que os casais ficavam quebrando uma perna para cá e outra para lá,. Naquele tempo não havia festa na Barra que não tivesse "a hora da música lenta", recorda Rubem Milhomem.
            Havia também os intervalos de 20 minutos, que eram um show à parte, pois entrava em cena o tradicional leilão (não havia festa na Barra que não tivesse o tal do leilão, que se resumia na venda de um mimoso prato contendo uma banda de frango assado devidamente acompanhada por uma gloriosa "mão-de-farofa" (porção de farinha seca com corante, ficava bem amarelinha).
            E o locutor (quase sempre o Mandu), anunciava, histérico, aos berros – Primeiro lance! Deeeeez mil cruzeiros para o Jun-ti-nhaaaa! Vinte! Vinte mil cruzeiros para o A-ze-ve-doooo! Vinte mil cruzeiros para o Juntinha—não-comer!...
            A bem da verdade, Os Populares do Ritmo fizeram a alegria dos barra-cordenses de todas as idades. Tinham excelente qualidade para um grupo tupiniquim. Mesmo os seus deslizes, eram relevados. Os músicos de Os Popilas, individualmente considerados, eram competentes, mas sempre faltou, por assim dizer, um diretor musical, um coordenador, um harmonizador. Vez por outra, acredite, "o andamento desandava", ou seja, o cantor entrava com uma música e a banda simplesmente não acompanhava. Também acontecia da banda dar um tom e o cantor entrar com outro. No meio da apresentação não era raro acontecer algum problema técnico, tipo uma guitarra ficar muda, estrilar etc., assim, definitivamente, não era possível. Para completar, o cantor cantava músicas com letras em inglês simplesmente sem saber inglês, a enrolação resultava numa espécie de "tupi-guarani-embromation". Tudo isso fazia parte da auréola do folclore e admiração que se formou em torno da banda.
            No final dos anos 80 a banda Populares do Ritmo já não acompanhava os avanços tecnológicos e musicais e a exigência do mercado, que é o público, com a crescente concorrência de outras bandas de fora que vinham para a cidade e vendiam seus shows por metade do preço que cobravam “Os Popilas”.
            Com essa prática nociva foram escasseando os contratos, e por conseguinte os ensaios e shows. Os componentes já não tinham o mesmo pique de antes. O comprometimento acabou e daí para a dispersão e encerramento das atividades foi um passo. Compromissos agendados e não cumpridos por motivo da falta de alguns integrantes que não queriam viajar, resultaram em prejuízos.
            A conta dos insucessos, ocasionalmente vinham bater à porta de Jaldo Santos, que, sempre organizado e responsável, não admitia esse tipo de coisas. Após reunirem-se e conversarem bastante, alguns dos membros, dentre eles o maestro Joaquim Bílio, que detinha uma discreta sociedade, acharam por bem encerrar as atividades da gloriosa banda Os Populares do Ritmo. No rescaldo, venderam à diversas pessoas os instrumentos que restaram.
            O advogado Rubem Milhomem sintetiza bem o que representaram Os Populares do Ritmo: “Para mim, aqueles meninos eram todos heróis - não tinham nenhuma formação acadêmica na área da música, nem sequer sabiam ler partituras, tocavam simplesmente de ouvido, na experiência e na coragem, eram muito mal-remunerados, e, apesar disso tudo, fizeram a felicidade de várias gerações, animaram tantas festas, fizeram o pano de fundo de tantas histórias, enfim, fizeram das nossas vidas algo muito melhor de se viver naqueles tempos. Esse é o grande legado que ninguém tira dos inesquecíveis Popilas.”

Nota: Abaixo publicamos os depoimentos de dois componentes do conjunto, ressalvamos de que foi preservado na íntegra, visando preservar a autenticidade dos fatos, mesmo com algumas informações por vezes conflitantes quanto a nomes, algo muito natural, quando se reporta à uma época já bem distante.

DEPOIMENTO DO MAESTRO JOAQUIM BÍLIO: 

“No início era uma sociedade, formada com os rapazes daqui mesmo, depois começamos a buscar músicos também de fora. Jaldo era o administrador da sociedade e era quem financiava os aparelhos.

Joaquim de Oliveira Bílio conta que o conjunto começou já caindo no gosto do povo e chegou até a tocar perto de São Luis, na cidade de Itapecuru. Tocou em Floriano, no Piauí. Sempre faziam reuniões para deliberar qualquer assunto. Segundo o maestro Joaquim, a escolha do nome Os Populares do Ritmo foi um consenso dele com Jaldo. Uma vez fomos tocar em Boa Vista do Padre João, que hoje tem outro nome, creio que é Tocantinópolis. Araguaína também foi visitada. Tocamos uma vez só em Tocantinópolis. Me lembro que o pessoal de lá exigiu que tocássemos uma certa música em inglês e nós tivemos que ensaiar, mesmo sem saber falar patavinas na língua inglesa e nós tocamos e fomos aplaudidos. “Ficamos arremedando igual a papagaio”. Dá uma risada e diz que ainda tiveram que tocar na penumbra, o que dificultou mais ainda o negócio, pois não se podia ver a partitura com a letra em inglês.

As vezes algum instrumento dava problema na véspera de uma viagem e só quem dava jeito era o Izael (Gael) Lobão. Não tinha outro. Era só ele quem consertava os instrumentos.

Uma certa época houve um retrocesso na caminhada do conjunto, pois vinham conjuntos de fora e cada qual com uma atração e promoção diferentes. Isso despertava a curiosidade das pessoas. Um outro trazia uma cantora. Outro já trazia duas cantoras. E com isso tivemos que também providenciar uma cantora para fazer parte dos Populares do Ritmo. Convidaram uma moça que se chamava Francisca. Quando havia viagens, Joaquim tomava a frente e providenciava uma hospedagem especial pra ela, ao mesmo tempo que combinava com os demais integrantes para não contarem piadas pesadas. E assim o clima de trabalho nas viagem ocorria dentro do devido respeito. Joaquim diz que ela tinha uma boa voz, aguda, e não era desafinada. No entanto, ele lembra que no primeiro ensaio, ele percebeu que ela atravessava um pouco o ritmo. Joaquim, músico por excelência, e muito criterioso disse para Jaldo que a moça não tinha condições, o que fez com que Jaldo se aborrecesse com Joaquim, visivelmente contrariado. Dizia que talvez fosse devido ao nervosismo dela. O fato é que ela prosseguiu, com a ajuda do maestro Joaquim, que modulava o compasso do acompanhamento, para ficar de acordo com o tempo da entrada. Com a continuação, chegou a evoluir sensivelmente naquele quesito em que deixava um pouco a desejar.

A Francisca era filha da Teresinha e do Zé Caixa Dágua. Foi casada por muito tempo com o Orlando Vitorino, até que se separaram. Me recordo que a avó dela era muda. Francisca vive atualmente no estado do Mato Grosso.

A Francisca deixou o conjunto por ela mesma. Depois apareceu outro cantor, com uma voz aveludada, microfônica, chamado João Canela, mas também não deu certo, pois não tinha ritmo. Depois foram aparecendo os improvisos: o Cipriano cantava, o Artur cantava e assim foi indo. O Artur no iniciou tocava trombone, mas depois mudou para o pistom. Eu tocava clarinete, mas como o clarinete não se afina musicalmente com outros instrumentos de um conjunto o Jaldo achou por bem comprar um saxofone.

Algumas músicas internacionais tocadas no Guajajara Clube foram: Only You, Rock Around Clock, Jambalaya, Czardas, Do You Wanna Dance, It´s Now Or Never, Tomorrow, Hotel Califórnia.

Lugares mais tocados: São João dos Patos, Paraibano, Colinas, Presidente Dutra, Grajaú, Imperatriz, Carolina. Em Carolina o Cipriano, que era bom baterista, se embebedou, e foi uma luta para ele se recompor a tempo de participar do show.
Outra vez fomos tocar em Governador Archer, terra do Agamenon. Nessa noite um bêbado quis criar caso e arrumar encrenca. O Artur se impacientou com aquilo e deu um tiro pra cima e o camarada saiu em disparada. Tememos até alguma represália por conta disso. Fomos para a casa do Agamenon, mas tudo transcorreu bem. Não houve maiores incidentes.
Joaquim diz que nas viagem não era permitido baderna e sempre era conservado um padrão educacional com muito respeito.
Nosso tecladista era um cearense chamado João Pinheiro. Esse tinha um mistério com ele. Na hora do intervalo ele sumia. Não havia quem desse notícia, mas quando o show ia recomeçar ele aparecia pontualmente. Muito bom músico. Também era chegado a tocar um violão e fazer suas serenatas. E tinha uma particularidade: Ele fumava, e guardava seus cigarros dentro do violão.”

DEPOIMENTO DE SEBASTIÃO ARTUR GALVÃO: 

“Iniciou precariamente, com poucos instrumentos, e aos poucos foram sendo comprados novos instrumentos como uma guitarra Gianinni, e caixas acústicas das mais modernas.

Primeiros integrantes: Joaquim Bílio, Artur Galvão, Juarez Bílio, Cipriano, Edson Bílio, Boninho (filho do Juarez), Manoel Clemente.

Tudo começou com uma guitarra Gianinni.

Ai veio um rapaz de Água Branca, que até já morreu, Teve o cabo Tiago, que tocava baixo, o Jaldo comprou o baixo e ele foi tocar. Foi comprada uma pianola para o Juarez. Depois, foi comprado um órgão. Por essa época, final dos anos 60, o conjunto começou a tocar fora, por que “ninguém é rei na sua cidade”, e a coisa foi crescendo. Os Fevers estouraram por aquela época, tocamos muito a música “Mar de Rosas”: Você bem sabe / eu não lhe prometi um mar de rosas / nem sempre o sol brilha / porém há dias em que a chuva cai).

Jaldo mandou buscar uma aparelhagem nova em folha em São Paulo. Para você ter uma idéia, “os instrumentos que Os Fevers usavam em São Paulo, Os Populares do Ritmo tinham aqui na Barra do Corda”. Veio de avião. Naquela época tinha linha aérea regular aqui em Barra do Corda, e o material novo veio de avião. A marca dos instrumentos musicais era Super Tremendão.

Artur se empolga na narrativa: ”Ai virou um conjunto profissional, tocava bem mesmo. Começou a ficar incrementado, com bateria de primeira. Com isso Os Populares do Ritmo foi ficando cada vez mais conhecido e a cair no gosto do povo.

Tocamos demais no Guajajara. O Carnaval na Barra era conosco, na Maçonaria. Não tinha pra mais ninguém. Quem não lembra das marchinhas carnavalescas: “Daqui não saio / daqui ninguém me tira / onde é que eu vou parar...” ou então: “A-lla-la-ô ô ô ô ô ô ô, / viemos do Egito... / Alá, meu bom Alá”.E a insuperável: “Mamãe eu quero / mamãe eu quero / mamãe eu quero mamar / dá chupeta / dá chupeta / dá chupeta pro neném não chorar”. O povo ia à loucura com: “Olha a cabeleira do Zezé / será que ele é / será que ele é / será que ele é bossa-nova / será que ele é Daomé / mas / se ele for transviado / isso eu não sei se ele é / corta o cabelo dele / corta o cabelo dele...” Ai cadenciava o passo com: “Cidade maravilhosa / cheia / de encantos mil / cidade / maravilhosa / coração do meu Brasil.” Emendava com: “Eu mato / eu mato / quem roubou minha cueca pra fazer pano de prato / minha cueca / tava lavada / foi um presente que eu ganhei da namorada...! No final dos bailes carnavalescos nunca faltava o bordão: “Quem parte / leva saudades de alguém / que fica chorando de dor... / ai, ai, ai, ai / ta chegando a hora / o dia já vem raiando meu bem / eu tenho que ir embora”.

Também íamos para o interior. De maio até julho, quando iniciava as festas as pessoas sempre vinham pedir pra gente tocar, por exemplo, no Barro Branco, Cinturão, Jacaré, Jenipapo dos Vieiras, Lagoa do Coco, Três Lagoas do Piraca.

O rojão era pesado, nós começávamos a tocar na sexta feira, e ainda tinha que tocar aqui no Balneário sábado à noite, e no Clube Realce, do Zé Ozias, no domingo.

Do meio pro fim, a concorrência ficou muito grande e o pessoal passou a não pagar, e a despesa também foi aumentando.”

Artur Galvão afirma que o grande baluarte sempre foi Jaldo Santos. Os prefeitos que mais incentivaram a música aqui na Barra foram o Edson Falcão da Costa Gomes, a Darci Terceiro e Manoel Mariano de Sousa que criou a Banda do Município.”

Nota 2: Agradecimentos sinceros pela colaboração e paciência a alguns amigos, que sem eles não teria sido possível a realização deste artigo, dentre eles: Jaldo Santos, Joaquim Bílio, Artur Galvão, José Carmélio, Edson Bílio, Vaneyde Freitas, Mário Hélder, Heider Moraes, Juarez Santos, Rolim, José Damasceno, Anísio Filho, Rubem Milhomem e José Edno.

*Álvaro Braga é membro do Instituto Histórico e Cultural de Barra do Corda

 

(TB/31/out/2010)