Artigo
Centenário de nascimento de Nélson Rodrigues
jornal Turma da Barra
 

Centra Nélson Rodrigues suas pesquisas
 e observações na criação de uma linguagem coloquial, 
rompendo, por vezes, os padrões cultos da língua portuguesa

*Nonato Silva

         Em 23 de agosto de 1912, em singelo berço, vagia e soluçava o recém-nascido Nélson Falcão Rodrigues, sem púrpura nem ouropéis.
         O saber e a virtude, em seguro paralelo, rondavam-lhe o berço. Sobretudo, a virtude — essa flor perfumada e sã —, ao lado da verdade que faz nascer o sublime.
         Cresceu de data em data.
         Adquire firmeza, ao evoluir de sua juventude para dominar a arte, enriquecer os recursos espirituais, em busca da perfeição que são a ambição e o dever de todos que tomam da pena para esculpir, no papel, o facho de suas ideias e sensações, alimentando o aroma de que o tempo não limita e retrai.
         Desde cedo, revelou-se o jornalista, o cronista, o dramaturgo, o humorista, apanágio de sua existência.
         Que o digam e provem os folhetins que o fizeram grande, ao lado de Martins Pena, França Júnior, e outros.
         Suas crônicas, partidas dos folhetins caracterizam uma marcante ficção, revestidas de dramaticidade, comicidade e modernidade, cuja linguagem transita para o teatro redivivo.
         Sua vocação literária é voltada para a inovação, com vistas à linguagem cênica e quebra de preconceitos sociais.
         Centra Nélson Rodrigues suas pesquisas e observações na criação de uma linguagem coloquial, rompendo, por vezes, os padrões cultos da língua portuguesa.
         Vê-se que este recifense absorve a força de um destino que o faz alto e soberano, nas asas de sua produção literária, recamada de vida e graça.
         A dureza de suas crônicas, de seu humor e de seu teatro fá-lo maior do que se pensa e ajuíza.
         Com tais propósitos, conquistou um público, como poucos.
         Estes predicados fizeram-no imortal, na perenidade da história dos vultos que o tempo consagrou.
         Deixou, portanto, inúmeras telas de gênero, história e retratos, por ter sido paladino das letras, herança de uma época que não volta mais.
         Sua prontidão há de permanecer no cerne da história.

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília (DF)


(TB/23ago2012)

 

Artigo
Neiva Moreira
jornal Turma da Barra
 

Que os fortes, os bravos,
Só pode exaltar.
(Gonçalves Dias)

*Nonato Silva

José Guimarães Neiva Moreira nasceu em Nova Iorque-MA, aos 10 de outubro de 1917. Filho de Antônio de Neiva Moreira e de Luzia Guimarães Moreira.
         Viveu no meio de destacados políticos de sua família, como José Neiva de Sousa, deputado federal e senador pelo Maranhão; Pedro Neiva de Santana, Governador do Estado; Jaime Neiva de Santana, deputado federal, e Evaldo Neiva, deputado estadual.
         Muito jovem, ingressou no jornalismo. Em companhia de vários amigos, fundou, em Floriano-PI, o periódico A Luz. Com Carlos Castelo Branco, fundou, em Teresina-PI, o jornal A Mocidade.
         Em São Luís-MA, fez-se jornalista do periódico Pacotilha, participando da incorporação desse jornal aos Diários Associados.
         Em 1942, foi para o Rio de Janeiro-RJ, onde passou pelos jornais Diário da Noite e O Jornal, e revista O Cruzeiro

Ingressou, como redator, no Instituto Brasileiro do Café – IBC.

Em 1950, elegeu-se deputado estadual do Maranhão.

Assumiu, corajosamente, a criação da Petrobras e da Eletrobrás.

Assumiu, também, a liderança da oposição.

         Em 1954, elegeu-se deputado federal, pelo Maranhão, tornando-se vice-líder da minoria. É um dos fundadores da Frente Parlamentar Nacional, integrada por deputados do PTN, PSD, UDN e PSB.
         Em 1958, fez parte da Comissão Parlamentar de Inquérito, com o fim de vigiar, no Brasil, a American Can Company, bem como os efeitos da Instrução nº 113 da Sumoc.
         Ainda, em 1958, reelegeu-se deputado federal pelo seu Estado. E participou da Comissão de Legislação Social e da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados.
         Com muita eficiência e acerto, presidiu a Comissão de Transferência da Capital do Brasil, Rio de Janeiro-RJ, para a nova capital do Brasil, Distrito Federal atual.
         De 1959 a 1960, foi Secretário da Câmara dos Deputados.
         Em 1959 apoiou a Revolução Cubana e o reatamento das relações diplomáticas e comerciais com a Rússia, 1961.
         Defendeu com fé, denodo e esperança, a reforma agrária, bem como a reforma eleitoral, para se permitir o voto do analfabeto.
         Em 1962, elegeu-se, para a terceira legislação, tornando-se amigo íntimo de Leonel Brizola e João Goulart.
         Com o levante militar que decretou ditadura no País, em 31 de março de 1964, Neiva Moreira teve seu mandato de deputado federal cassado, bem como seu Jornal do Povo fechado e incendiada a sua sede.
         Foi preso, mas conseguiu exilar-se na Bolívia, onde dirigiu o jornal Clarín.
         Com a vitória dos militares bolivianos, em 1964, teve que mudar-se para o Uruguai. Ali, editora os jornais Sur e Izquierdo, El Oriental, El Debate e Aora.
         Mas teve que exilar-se na Argentina. Em Buenos Aires edita a revista Tercer Mundo, mais tarde, chamada de Cuadernos del Tercer Mundo. E, com a arrogância de Isabelita Perón, teve que desativá-la, sendo seus pontos de venda incendiados e seus colaboradores perseguidos.
         Em 1974, foi expulso da Argentina. Partiu, então, para o Peru. Ali, passou a trabalhar na editoração internacional do jornal El Commercio. Também, foi assessor de imprensa do presidente peruano Juan Velasco Alvorado. Derrubado este, por um golpe militar, em 1976, Neiva Moreira viu-se obrigado a exilar-se no México.
         Na capital mexicana, relançou Cuadernos del Tercer Mundo. E criou o livro Guia de Tercer Mundo. Ali, colaborou no jornal Excélcio.
         Anistiado, Neiva Moreira demanda as plagas do Brasil, em outubro de 1979.
         E assumiu sua função de redator no IBC.
         Em 1983, foi nomeado Secretário de Comunicação Social do governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola. Depois, nomeado presidente do Banco de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul.
         Em 7 de maio de 1992, foi eleito membro da Academia Maranhense de Letras, ocupando a Cadeira nº 16, fundada por Raimundo Correia.
         Em 14 de dezembro de 1993, suplente que era, assume a cadeira de deputado federal, integrando, como titular, a Comissão de Relações Exteriores e a Comissão de Constituição e Justiça e de Redação, bem como suplente, da Comissão de Educação, Cultura e Desporto. Permaneceu na Câmara Federal até 30 de março de 1994.
         Em 1996, editou-se o livro Neiva Moreira, o jornalista do povo, de autoria do jornalista e acadêmico Benedito Buzar.
         Em 1998, vem de integrar, como titular, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, tornando-se seu presidente.
         Em 1998, elegeu-se deputado federal pelo Maranhão, com mais de 51 mil votos.
         Fora casado com Natália Silva Moreira, gerando Antônio Luís Neiva, escrivão aposentado em Brasília. Do casamento com Biatriz Juana Isabela Brisio Staricco, teve quatro filhos.
         Publicou Fronteiras do mundo livre, Brasília hora zero, O nasserismo e a Revolução do terceiro mundo, O Exército e crise peruana, O modelo peruano, O pilão da madrugada.
         Faleceu em São Luís-MA, aos 10 de maio de 2012, carregado de grandeza espiritual, intelectual e moral.
         O anoso carvalho tombou, mas deixou as raízes donde surgiram novos rebentos e abrolhos.
         Esta a trajetória luminosa do erudito jornalista, êmulo de João Francisco Lisboa, e do exímio político maranhense-brasileiro-internacional Neiva Moreira.
         O Maranhão, o Brasil e o mundo hão de cantar-lhe, eternamente, a memória, na rigidez do bronze.

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília (DF)

(TB/29mai2012)

 

 

Artigo
Francisco Walter Meneses
jornal Turma da Barra
 

Tu és sacerdote para sempre (Sl 110,4)

 

Nonato Silva

Litterae thesaurum est, “a cultura é um tesouro”.
Petrônio, Ceia de Trimálquio, 46,8.

             Nasceu em fortaleza-CE, em 10 de julho de 1923. Filho do exator estadual Alberto Walter Meneses e de Odete Chaves Meneses. Foi coletor estadual em Barra do Corda - MA.
            Deixou viúva Celina Ribeiro Meneses, irmã do professor Nonato Silva. Os filhos Fernando, José Alberto, Tereza Cristina, Ana Luiza, Alberto Jorge, Silvana, Lúcia e Francisco Walter Filho Ribeiro Meneses. Os netos Robnei, Guilherme, Bruno, Juliana, Alberto Jorge, Renata, Mônica, Filipe, Saulo e João Paulo. Bisnetos Gabriel e Gustavo.
            Francisco Walter Meneses foi prefeito municipal de Barra do Corda durante 2 anos, 8 meses e 10 dias, ou seja, de 13 de abril de 1944 a 4 de fevereiro de 1946, sendo o 23º prefeito daquela cidade (Barra do Corda na História do Maranhão, de Galeno Brandes, pág. 173).
            Teatrólogo. Poeta. Escritor. Historiador. Músico. Contista. Cronista. Ensaísta. Linguagem pura, graciosa.
            Deixou os inéditos Vendaval de Poemas, Ensaio Literário “Beatriz”, Angélica Razão, Poemas à Virgem Maria, Composição Literária.
            Cofundador, na companhia de Frei Paulo de Barra do Corda, Éden Salomão, Conceição Guimarães, Wolney Milhomen, Lourival Pacheco e outros, do “Grêmio Machado de Assis”, em 1946, transformado, posteriormente, em “Grêmio Maranhão Sobrinho”, e, hoje, “Academia Barra-Cordense de Letras”, fundada em 28 de julho de 1992.
            Produzia, diariamente, o programa da “Ave-Maria”, o Ângelus. Estilo sóbrio. Atraente.
            Honesto, bom pai de família, caráter louvável, estudioso, religioso. Imprimiu na família uma sólida educação. Boa erudição. Os anos se lhe escoaram tranquilos. Passou bom nome à sua posteridade. Porque só os grandes ideais formam os grandes sentimentos e só os grandes sentimentos apresentam e consolidam os grandes feitos.
            Esta a trajetória de Francisco Walter Meneses.
Faleceu em Fortaleza-CE, aos 5 de maio de 2012.
Teve um sepultamento muito concorrido ao som de violinos.
Publica-se-lhe o poema que se segue.

Alma Acorrentada

Francisco Walter Meneses

 

Se a alma humana fosse uma gaivota

A beijar a fimbria dos oceanos

Ao pôr do sol rubrando o ocaso 

Certo rumaria mar afora

Na esperança da última claridade

Atração eterna da final morada.

A claridade do infinito intangível

Que a força da lei cósmica consome

E consumida, volatiza no etéreo

Continua sem cessar perseguindo

Essa claridade que a tudo inebria

Atração eterna da última morada.

 

Infeliz, porém, é o seu estado

Acorrentada à carne malsinada

Não voa, rasteja, tropeça e cai...

Se tem anseios a decepção destrói

Se tem amor amargurada chora 

A desdita de ter nascido escrava.

Escravizada ao ódio e às impurezas

Ferreteada de inveja e de paixões

Quer liberdade a consciência acusa

Condição deveras obstinada

Aos caprichos da humana vida

De luta, alegria e sofrimento.

Nos lampejos da fé abraseada

Torna alçar voo desesperada

Em demanda do páramo tranquilo

E inebriada, confiante e feliz

Adeja sobranceira o firmamento

Espelhando-se na argêntea luz.

Retoma contrafeita a seu estado 

Infeliz e degradante invólucro

Amesquinha-se na torpe vaidade

Manchando-se na ira animalesca

E um denso véu de tristeza invade

A mais recôndita de sua morada.

No sossego divino da consciência

Examinando com luz os seus atos

Ergue-se qual muralha o remorso

Barreira intransponível de justiça 

Que marca pose, que limita reino

Do que é justo, equitativo e bom.

Se se pudesse ater-se ao voo alado

Na pureza doirada dos sentimentos

Quão bela é a rota... que maravilha

Colher no mar a brisa matutina

O despertar da paz e da bonança

Forca pujante que a tudo consola

No passado longevo da humanidade

No nascedor antigo das civilizações

A besta humana campeava solerte

Espalhando com desprezo a desventura 

Ceifando vidas, destruindo tudo

Toldando o destino da criação.

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília (DF)

(TB/15mai2012)

 

 

Artigo
Centenário de nascimento
Padre Fernando Albuquerque Vasconcelos

jornal Turma da Barra
 

Tu és sacerdote para sempre (Sl 110,4)

*Nonato Silva

Nasceu o Padre Fernando Albuquerque Vasconcelos, em Balsas-MA, aos 8 de maio de 1912. Faleceu no Rio de Janeiro-RJ, aos 16 de abril de 2002.
Filho de José Francisco Albuquerque Vasconcelos e de Maria Angélica Albuquerque Vasconcelos. 
            O Padre Fernando obteve o rescrito da Santa Sé, e casou-se com Ornélia Almeida Vasconcelos. O casal teve duas filhas: Maria de Fátima Vasconcelos Montoni, e Maria Angélica Vasconcelos Natal. 
            Falecidas 
            Maria de Fátima casou-se com Sérgio Augusto Gribel Montoni. O casal teve os filhos: Bruno Vasconcelos Montoni, e Paulo Vasconcelos Montoni.
            Maria Angélica casou-se com Edgar Conceição Natal. O casal gerou os filhos: Fernando Vasconcelos Natal, Edgar Conceição Filho, e Clarice Vasconcelos Natal.
           Padre Fernando era muito culto. Dominou o latim e o português, como poucos. Exímio orador, de facúndia ímpar e eloquência singular. Panegirista impecável. Êmulo de Massilon e Bossuet, Alves Mendes e Valdivino Nogueira. Verbo candente. Estilo primoroso.
            Revestia-se de graça e firmeza de caráter.
            Por tudo isso é que se comemora festivamente seu centenário de nascimento, em homenagem sincera de conterrâneo e admirador, bem como de familiares e amigos.

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília (DF)

(TB/8abr2012)

 

 

Artigo
Os 90 anos da Semana de Arte Moderna
jornal Turma da Barra
 

Este ano, em fevereiro, fez 90 anos da Semana de Arte Moderna, 
movimento que para sempre revolucionaria a literatura e as artes brasileiras em geral. 
O professor barra-cordense Nonato Silva relembra a data e os efeitos daquela ‘Semana’, 
que aconteceu no Teatro Municipal de São Paulo

*Nonato Silva

            Todo movimento social é precedido de causas.
            Ora, o mundo inteiro, após a primeira Grande Guerra, caiu em gigantesca ebulição.
            Então, as artes foram as mais atingidas. Daí, o histórico movimento modernista. De certa forma, ligado ao futurista de Filippo Tommaso Marinetti (1876-1944) poeta italiano.
            E, como a literatura é sempre um espelho da sociedade, ele aí está, com a força da tragédia satírica Le roi Bombance, apresentada pelo poeta, em Paris, em 1905.
            E o Brasil tinha que aderir a este movimento artístico moderno, que teve início em janeiro de 1916, com uma pintura de Anita Malfatti, exposta em São Paulo, produzindo escândalo. Tanto que Monteiro Lobato escreveu um artigo intitulado: “Manifestação ou Paranoia?”
            Daí, a realização da Semana de Arte Moderna, em São Paulo, de 11 a 18 de fevereiro de 1922, marcando o começo do Modernismo no Brasil. E constou de exposição de artes plásticas, recitativos literários e concertos musicais.
            Estuário das aspirações de um grupo de intelectuais e artistas, a Semana visava à criação de uma autêntica cultura nacional, que representasse um fenômeno estético, num processo histórico-social proveniente das transformações em nossa sociedade.
            A exposição constou de 19 trabalhos de arquitetura, 17 de escultura, 64 pinturas.
            No dia 13 de fevereiro, Graça Aranha pronunciou a célebre conferência A Emoção estética na Arte Moderna. Foram executadas peças musicais de Vila-Lobos, Ronald de Carvalho falou sobre Pintura e Escultura no Brasil.
            No dia 15 do mesmo mês Menotti Del Picchia lança as bases da revolução das artes. E sobre o movimento deflagrado pela Semana, expressou-se Mário de Andrade: “Não foi o fator de mudanças político-sociais posteriores a ele no Brasil. Foi essencialmente um preparador; o criador de um espírito revolucionário e de um sentimento de arrebentação.”
            Em 1951, Getúlio Vargas, comandante da revolução de 1930, declarou: “As forças coletivas que provocaram o movimento revolucionário do Modernismo na literatura brasileira, que se iniciou com a Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo, foram as mesmas que participaram no campo social e político da revolução vitoriosa de 1930.”
            O Modernismo fez com que a inteligência brasileira adquirisse plena maturidade, completa autonomia, não desprezando as fontes culturais universais.
            As pesquisas artísticas alargaram o horizonte cultural da nação, atingindo outras áreas de movimento similares.
            Daí, as constantes culturais do movimento modernista prefigurarem a literatura, a ciência social, as artes plásticas e quejandos.
            O Modernismo em Portugal proveio do movimento do Orfeu, ao qual compareceram os brasileiros Ronald de Carvalho e Luís de Montalvor.
            No Brasil, os modernistas rejeitaram o manifesto de Marinetti, por não convir ao nosso movimento.
            O movimento modernista brasileiro calcado nos princípios definidos na Semana de Arte Moderna, opôs-se radicalmente ao naturalismo, ao parnasianismo, ao academicismo, à literatura de Olavo Bilac, Alberto de Oliveira, Coelho Neto, Rui Barbosa, Euclides da Cunha, ao estilo herdado da prosa classicizante, em suma.
            Tanto que Graça Aranha, autêntico defensor do movimento modernista, em junho de 1924, numa sessão da Academia Brasileira de Letras deu morras à Academia, num discurso célebre, em que empregou a palavra dinamismo a torto e a direito, em linguagem empolada, sem um fim visível.
            Medeiros e Albuquerque, numa ironia fina, respondeu-lhe, analisando sua obra, seus gestos iconoclastas, dizendo-lhe que todas as ideias novas são respeitadas pela Academia, mas que não entendera o que Graça Aranha — aranha sem graça, chamou-lhe Coelho Neto — queria.
            Já em 1914, Anita Malfatti, em ânsia renovadora, organizou uma exposição de pintura expressionista. Antes, porém, em 1913, Lasar Sagall fizera o mesmo.
            Também, o intimismo e penumbrismo de Ribeiro Couto, de Mário de Andrade, de Manuel Bandeira, de Ronald de Carvalho, sempre visando aos tentames renovadores.
            A Semana foi mais um ponto de chegada que de partida. Por isso, disse Aníbal Machado: “Não sabemos definir o que queremos, mas sabemos discernir o que não queremos.”
            Tristão de Ataíde definiu as tendências ao culto do movimento, tendo em vista sua velocidade e técnica:
            Dinamistas, Graça Aranha, Guilherme de Almeida, Ronald de Carvalho.
            Primitivistas, Oswald de Andrade, Raul Bopp.
            Nacionalistas, Plínio Salgado, Cassiano Ricardo, Menotti Del Picchia, e outros.
            Espiritualistas, Tasso da Silveira, Andrade Murici, Cecília Meireles, Murilo Mendes, e outros.
            Desvairistas, Mário de Andrade, e outros.
            O movimento assim concebido, disseminou-se rapidamente nos estados. Órgãos de divulgação editaram-se.
            Passada a efervescência da revolta lítero-artística, no mundo inteiro, que se pode situar entre 1922-1930, começa, como sempre, o período construtivista. Então surgem, na ficção, os que vão realizar a difícil aliança de regionalismo, modernidade e compromisso social.
            O movimento atingiu, em redondo, todos os credos, quer literários e artísticos, quer religiosos, em toda órbita terrestre.
            E já se acentuou, com razão, que o ano de 1922 foi a data mais decisiva das letras brasileiras contemporâneas, e alienígenas. Foi o ano em que, em São Paulo, ocorreu a “Semana de Arte Moderna”, pródromo do movimento modernista nas letras.
            Da matéria, surgiram Luz Mediterrânea, de Raul de Leoni, Epigramas irônicos e sentimentais, de Ronald de Carvalho, A Paulicéia Desvairada, de Mário de Andrade.
            Daquela data, fizeram-se aparecer obras-mestres demonstrando o reconhecimento da nova fase revolucionária espiritual, mais precisamente católico: A Igreja, a Reforma e a Civilização do Pe. Leonel Franca, Pascal e a Inquisição Moderna, de Jackson de Figueiredo, A Vida Sobrenatural e o Mundo Moderno, de Alceu Amoroso Lima (Tristão de Ataíde).
            Novos movimentos se têm seguido ou jeito sentir, como o Sobre-Realismo e o Concretismo.
            Mas, de fato, é de 1922 que data uma nova época e uma nova consciência da literatura brasileira.
            Mesmo assim, pilhérias e gozações não faltaram, como:

            “Na Cadilac mansa e glauca
            passa o Oswald de Andrade
            gênios entre a multidão!”

            E mais:

            “Embora seja um poeta futurista
            Não é, por certo, um poeta futuroso.”

            É que a “Semana de Arte Moderna”, cumprindo o seu ciclo histórico, vive nos píncaros de seus 90 anos.

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília (DF)


(TB/1ºabr2012)

 

 

Artigo
Souza Bispo
jornal Turma da Barra

*Nonato Silva


            Cândido Pereira de SOUZA BISPO, nascido em 3 de outubro de 1896 e falecido em 15 de julho de 1950, constitui o orgulho e a glória do Grajaú, do Maranhão e do Brasil.
            Filho de humilde lavrador, atinge a grandeza e as culminâncias do Direito e a montanha da Academia Maranhense de Letras, fundando a Cadeira número 27, patroneada por Dias Carneiro.
            Estudou nos bons colégios de Barra do Corda, entre eles, o de José do Patrocínio Martins Jorge, sendo colega de meu pai José Ribeiro da Silva. Também no Externato Maranhense de Osório Anchieta. E no Ateneu Sertanejo, sob a direção de Euclides Maranhão.
            Neste colégio, ainda como aluno, movido de alta vocação jornalística, funda a Arte, de curta duração, bem como Óculo. Todos ilustrados manuscritamente.
            Ainda em Barra do Corda, em 1914, cria Os Simples, jornal de aceitável circulação até 1918.
            Em São Luís, em 1915, dirige O Imparcial, jornal de valor político e de grande conceito na sociedade.
            Em Marabá-PA, institui um colégio e um grêmio literário, fazendo circularem Esperança e Fiscal.
            Em Belém, capital do Pará, com Aníbal Duarte e Ramalho Júnior, publicava, em 1918, Evolução, jornal de efeito e repercussão.
            Altamira-PA foi agraciada com um colégio e o jornal Atenas por ele fundados.
            Em Grajaú, 1922, assume o jornal Eco do Sertão, até então dirigido por Jaime da Costa e Caio Franco. E funda, ali, o Colégio Isaque Martins, com muito proveito para a cidade de Antônio Francisco dos Reis, de práticas didático-pedagógicas apreciáveis.
            Na capital do Maranhão, presta necessária colaboração ao jornal Diário de S. Luís. E ali aproveita o tempo para escrever, em versos, a peça Independência, recebendo encômios de Lima Barreto e Padre Dubois. E, com Isaque Ferreira, vem de editar a revista mensal O Sertão, um veículo de fortes impactos nos meios culturais.
            Nos idos de 1922, no Rio de Janeiro, torna-se colaborador de A Política, bem como da Revista Escolar de João Rodrigues. Também, ali, edita sua própria revista intitulada Tupi de destacado bom gosto.
            Tal qual Euclides da Cunha, o homem dos Canudos e da Amazonas, na ânsia de conhecer a interlândia do Brasil, interrompe as edições da revista Tupi, e monta a percorrer “mais de oitocentas léguas, a pé, do Rio de Janeiro a São Luís, de novembro de 1922 a julho de 1923”, ato inusitado na história pátria.
            É bem vasta a obra literária de Souza Bispo. Veja-se, então. “Independência, peça cívica, em um ato, em verso, São Luís, 1921; Espinhos de Mandacaru, crônicas, Tipografia M. Silva, São Luís, 1925; Alea iacta est, mensagem espírita, São Luís, 1927; Notas e Pareceres, Oficina Gráfica Tribuna, São Luís, 1935; O Dia da Justiça, discurso, São Luís, 1944; Batendo à Porta do Templo, Gráfica Maranhense Ltda, São Luís, 1947; A estrutura geológica do Maranhão e a existência do petróleo, Editora Aurora, Rio de Janeiro, 1949; Mensagem de Civismo, Gráfica Leite, São Luís, s/d.”
            Há os inéditos, como Pedaços de Minha Terra; Na Rota dos Bandeirantes, O Sol das Almas, Cartas do Jeca, Campesinas, Casos Jurídicos, Pelo Ministério Público, Dicionário Corográfico de Coroatá.
            Para melhor entendimento de Souza Bispo é indispensável consulta à bibliografia que ora se apresenta: “Coelho Neto: Um Herói, in Bazar, Porto, 1938; Arnaldo Ferreira: Dias Carneiro e Souza Bispo, São Luís, 1951; Mário Meireles: Panorama da Literatura Maranhense, São Luís, 1955; Revista da Academia Maranhense de Letras: Falecimento do Acadêmico Souza Bispo, volume VIII, São Luís, 1950; Revista de Geografia e História: Souza Bispo, São Luís, 1954.”
            Eis a flor de uma intelectualidade que deu ele ao mundo, como supremo produtor de cultura literária na arquitetura da frase e na engenharia do pensamento.
            No decorrer dos anos, firmava-se-lhe o nome no seio de nossa literatura nacional, em paixão e vigor, em brilho e opulência, em graça e louçanias de estilo, com a palavra terça e pura.
            Tive eu, por mais de uma vez, a felicidade de sentir, pessoalmente, a sua cultura, e privar de sua grandeza de alma.
            Em tudo que lhe alcativa e orna o espírito, há-lhe belezas geniais e suspiros de legítimo entusiasmo, em colorido e forma, em sutileza e conteúdo.
            E sua competente obra, em altivos arroubos de segurança, sua ação, seu comportamento, sua produção literária e científica emolduram eternamente os belos céus de Grajaú, onde viu a luz do dia, pela primeira vez, sua genitora feliz, qual mãe nutriz.
            Souza Bispo vive!

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília

(TB/24abr2011)

 

 

Artigo
Origem da palavra Portugal
jornal Turma da Barra
* Nonato Silva

            Portugal - Do antigo Portucale, designando a primitiva cidade do Porto, resultante de Portu-Cale, acusativo latino Portum-Calem, na forma vulgar de Cales Portus. Cales era uma povoação junto do Douro, de origem obscura, talvez celta.
            As formas Potumcale, portucale: apareceram no século V. Portocale, nos séculos VI e VII. Portogali, nos séculos VII e VIII. Depois, Portocale, no século IX.
            Nos Diplomata et Chartae, tem-se Portugal (e) em 922, 951, 960, 982 e 995.
            Portukal, em 1013. Portugal, em 1041.
            Como se vê, a grafia Portugal já usada no século XI.
            Em 1875, consoante Adolfo Coelho, a forma Portugal aparece, em, definitivo, tal qual se encontra na Cruzada contra os albinenses, no trabalho Bibliografia Crítica de História e Literatura.
            Ao lado de Portugal, surgem Portugália (plural),que é do latim maçorral, colocado, hibridamente, de Portugal à imitação de Brittannia, Francia, Gallia, Germania, Hispania, Italia, assim feito por meros latinófilos, apenas por terminações vocabulares em -ia, sendo que a palavra seria Portugale ou Portucale.
            O certo é que o termo Portugalia, como tradução latina de "Portugal", está consagrado pelo uso das moedas, de muitos documentos, da Academia das Ciências, conforme consta nos Portugalia documenta Historica a seculo VIII post Christum usque ad quintum decimum.
            Trata-se, pois, de grafia errônea.
            Mesmo assim, dá-se a circunstância de Portugalia ser mais moderno que Portugal, palavra bastante encontrada no século XI. E é vista também em 1117, 1128, 1135, 1143, 1148, 1169, 1179, 1180.
            Tanto que, em Angola, há ou havia uma localidade com o nome Portugalia. Na formação do topônimo Portuqal ou Portuqalia não existe nenhuma relação com Gallia Assim, Portugália é mesmo que Portugal.

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília

(TB/16abr2011)

 

 

Artigo
Origem do topônimo Tresidela
jornal Turma da Barra
* Nonato Silva

            Topônimo exclusivamente maranhense, quer como substantivo comum, próprio e topônimo. Significa povoado ribeirinho defronte a cidade mais importante, na margem oposta de rios.
            Tresidela, conforme se lê em Bernardino José de Souza, Dicionário da terra e da gente do Brasil (São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1939), é o nome de uma localidade em Caxias-MA, desta forma chamada, em 1757, assim grafada: Trizidela.
            Para uns, o vocábulo é de origem indígena significando do outro lado. Mas, para Gonçalves Dias seria a alteração de Três Aldeias, hipótese plausível, de vez que Vila de Caxias das Aldeias Altas fora o nome primitivo da atual Caxias-MA escrito Trezidela, como vem registrado em Fragmentos da Companhia do Maranhão, de Justo Jansen, datado de 1901, como substantivo comum, na acepção de povoações da outra banda do rio.
            E eis como Justo Jansen esclarece o termo Tresidela: "Algumas cidades e villas do Itapecuru têm outro aspecto caracteristico: as trezidelas ou povoações d'outra banda, também observáveis em rios brasileiros".
            É o caso de Grajaú, Barra do Corda, Pedreiras.
            Aliás, a Tresidela (como se escreve hoje) de Pedreiras passou a município com o nome de Trizidela do Vale.
            A pesquisa continua.

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília


(TB/10abr2011)

 

Artigo
Ágora da Matriz
jornal Turma da Barra
*por Nonato Silva

            O homem é um ser impulsivo, cuja força de vontade, calcada pelo poder criativo da inteligência, tempera-lhe o espírito e o leva até a imolação de aventuras.
            Provam-no, à bastança, a visão e o ardil dos grandes navegadores,de Luís Carlos Prestes, Juarez Távora, Isidoro Lopes, na Coluna Prestes, o tenentismo, bandeirantes, e outros.
            Beethoven compunha passeando pelos campos. Homero peregrinava como as andorinhas. Hesíodo tinha a sua leira de semeadura. Ésquilo militou em Salamina. Sófocles e Eurípedes foram andrejos. Heródoto viajou largamente. Xenofonte internou-se na Ásia. Píndaro preconizava a agonística.
            Horácio seguia as legiões. Tácito percorria as terras bárbaras. Camões e Cervantes conheceram a nostalgia e sofreram as injúrias da vaga procelosa. Shakespeare, o andarilho, respirava o ar puro dos campos. Cristo e Maomet trilharam caminhos longos.
            Todos a garimpar e a aceitar ideia que é um fruto divino, em busca da inspiração que é o hausto e o hálito do cérebro.
            Também, ao molde, um cearense atilado, Manuel Rodrigues de MeIo Uchoa, com fé bretã, chega a uma belíssima e acolhedora enseada, na confluência dos rios Corda e Mearim, no Estado do Maranhão. Ali, funda uma histórica cidade que, hoje, se chama Barra do Corda, em 3 de maio de 1835, com um traçado geométrico, em quadriláteros, jamais visto na Terra de Gonçalves Dias.
            Reserva, pois, um desses quadriláteros, bem ao centro do perímetro urbano, para servir de Ágora. E foi bem no centro desse quadrilátero construída, sob o signo da Santa Cruz e da Imaculada Conceição de Maria, a Igreja Paroquial de Barra do Corda. Contava a Igreja com três naves, uma torre com sino e o coro dos cantores. Tinha o frontispício ereto retamente, e os fundos arredondados.
            Nessa Matriz batizei-me. Crismei-me. Fiz a Primeira Comunhão. E celebrei minha Primeira Missa na Terra Natal, conforme praxe eclesiástica e litúrgica, em 8 de dezembro de 1945.
            E a Ágora tornou-se célebre, historicamente, por ter sido o local onde os revoltosos da Coluna Prestes deixaram a marca das patas de seus cavalos e burros, em frenéticos sapateados, aterrorizando a população ordeira e pacífica de Barra do Corda (1925).
            E, na década de 1950, esta querida Matriz foi demolida, ficando todo o quadrilátero livre para a expansão e construção do que hoje se chama, com muito orgulho e raça, Praça de MeIo Uchoa, totalmente arborizada e ajardinada, para o lazer dos cordinos.
            E pede-se ao povo e às autoridades que erijam ali uma estátua condigna do Fundador da Cidade, em sinal de gratidão e de marco para o reino êneo da História.
            E havia um fenômeno sazonal, sobretudo, primaveril, que acontecia periodicamente na Ágora e na Matriz, máxime, sob o azul do céu do mês de maio.
            Ali chegavam bandos e mais bandos de passeriformes de arribação, que, por vezes, tampavam o sol. Eram as andorinhas, fissirrostros, bico negro e largo, cauda bífida, plumagem lisa, asas finas e compridas.
            Era de ver incontidas revoadas, em giros idiotas, voos elegantes e rasantes, rasgando o espaço da Ágora e da Matriz, empanando o brilho do sol, antecedendo os supersônicos.
            Nidificavam nos beirais das telhas. Ocupavam as cimalhas e as cornijas da Igreja, com chilrear constante, agudo e ensurdecedor. Era de ver causarem alegria e prazer. Lembravam Rui Barbosa cronificando, perpetuamente, o mesmo fenômeno em Campinas-SP.
            Outro tópico, de relevo, eram os morcegos singrando os espaços noturnos, por serem noctivagos e hemeros, morando, agasalhados, sob o teto da Igreja. E os Padres permitiam que fossem abatidos, visando à limpeza do Templo.
            Então, pegava eu a espingarda de meu pai, costa de ferro, de carregar pela boca, usando arroz ou milho seco no lugar de chumbo. E logo o estampido estrondava nas abóbodas da Igreja, fazendo cairem mortos morcegos, em quantidade.
            Também utilizava-se uma vara de bambu, de quatro a cinco metros de comprimento, fincada ao solo, sendo balançada no espaço, quando se abatiam dezenas de ratos alados atraídos pelos assobios idiotas da molecada. Eis a história da Ágora da Matriz de Barra do Corda, no passado e no presente. Acolhedora Ágora, verdadeiro oásis para a população cordina.
            E hoje a vetusta Matriz passou, em outro local, a ser Igreja-Monumento, com esbelta torre, retendo medalhões dos Mártires de Alto Alegre.

*Nonato Silva é escritor e poeta, PHD em Filologia Românica, reside em Brasília

(TB/13fev2011)

 

Artigo
Alterações ortográficas
jornal Turma da Barra

Quem entra a introduzir uma lei nova não pode tirar de repente os abusos da velha.
Pe. Antônio Vieira

*por Nonato Silva

            O problema da ortografia da Língua Portuguesa tem constituído um forte pesadelo e um constante desafio para os lexicólogos, lexicologistas e ortografistas.
            A matéria remonta a séculos, quando se vislumbrava a estrutura da língua, em pleno período medieval.
            Assim, a linguagem e a literatura do português decorrem, em formação, do século XI ao começo do século XVI (1520).
            Então, procurou-se uma grafia das palavras, que viesse agasalhar essa linguagem e essa literatura nascentes.
            As palavras começavam, em transformação, a emancipar-se da língua-mãe, embora permanecesse o vínculo sanguíneo do étimo. A pontuação foi herdada do latim. E os sinais diacríticos foram criados, de vez que o latim não os tem.
            Desta forma, a ortografia ora pendia para o gérmen etimológico, ora para o fônico. Inteiramente às espensas de escritores e lexicógrafos.
            Em termo vocabular, a situação oscilava entre Morais Silva com seu Dicionário da Língua Portuguesa (1789), perseguindo o sistema fônico e Caldas Aulete com seu Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa (1881), cultivando o etimológico.
            Ao movimento aderiu Cândido de Figueiredo, com seu Dicionário da Língua Portuguesa (1899). 
            Esta ordem perdurou até 1911.
            Mas, já em 1885, o ortografista Gonçalves Viana lançava as bases da ortografia lusa, em Ortografia Nacional (1904).
            Assim, o Governo Português, em 15 de fevereiro de 1911, nomeava Comissão para “fixar as bases da ortografia”. Em 23 de agosto do mesmo ano, a Comissão apresentava relatório. E, por Portaria de 1º de setembro, mandava o Governo adotar “a reforma ortográfica nas escolas, documentos e publicações oficiais.”
            Ato contínuo, foi publicado o Vocabulário Ortográfico e Ortoépico da Língua Portuguesa de Gonçalves Viana, de acordo o que preceituava a Portaria. E, a partir de 1913, passou a chamar-se Vocabulário Ortográfico e Remissivo da Língua Portuguesa.
            Talvez, amedrontado, com o pensamento de Brunot, "uma das causas do atraso da instituição entre nós (França) são as complicações ortográficas da Língua Moderna", o Brasil tenha acordado. E, em 11 de novembro de 1915, a Academia Brasileira de Letras aprova o modelo ortográfico luso de 1911.
            Mas, em 24 de novembro de 1919, a Academia Brasileira de Letras revoga a decisão anterior, gerando o caos ortográfico no Brasil.
            No entanto, pelo Decreto nº 20.108, de 15 de junho de 1931, Brasil ratifica acordo ortográfico com Portugal. Portugal, pela Portaria de 27 de maio de 1931, já executava o Acordo. O Brasil, pelo Decreto nº 23.028, de 2 de agosto de 1933, o obrigava em todo o território nacional.
            Entrementes, a Constituição de 1934 dispunha no artigo 26 das Transições Transitórias; "Esta Constituição, escrita na mesma ortografia de 1891 e que fica adotada no país."
            Mas, pelo Decreto-Lei nº 292, de 23 de fevereiro de 1938, torna-se obrigatório o uso da Ortografia de 1931, a partir de junho de 1939.
            E o Decreto-Lei nº 5.186, de 13 de janeiro de 1943, diz que, na ausência de um vocabulário adrede, fica em vigor, nos termos do Acordo de 1931, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa organizado pelas duas Academias.
            Mas a ebulição ortográfica continuou. Então, surge a Convenção Ortográfica de 1943. Persistindo divergências, apareceu a Convenção Ortográfica Luso-Brasileira de 1945. Efeitos negativos. Portugal a adotou. O Brasil, não.
            Finalmente, em termos de Brasil, a Lei nº 2.623, de 21 de outubro de 1955 "restabelece o sistema ortográfico do Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa", cuja ressonância perdura até hoje, por razões póstumas. Apesar da odisseia por que passou.
            Mesmo assim, esta Lei sofreu algumas alterações ortográficas advindas da Lei nº 5.765, de 18 de dezembro de 1971, em razão de acordo entre Brasil e Portugal, mandando abolir o trema de onde ele nunca existiu (saimento, saudade), o acento diferencial, permanecendo em "pôde", bem como o acento das subtônicas (amàvelmente, pàzada, cortêsmente).
            Mas divergências ortográficas continuaram a existir entre Brasil e Portugal. Para mitigar a situação, tentou-se realizar no Rio de Janeiro, em maio de 1986, um encontro específico, com a presença de povos lusófonos. Inúmeras divergências, porém, impediram a efetivação do acordo.
            E, em 1990, em Lisboa, os países lusófonos firmaram um novo Acordo. Estabeleceram: "a) Os signatários do acordo devem convertê-lo em lei em seus respectivos países. b) A Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras serão responsáveis pela publicação de um vocabulário ortográfico comum da língua portuguesa".
            O Acordo prevê:
            "Artigo 29 - Os Estados signatários tomarão, através das instituições e órgãos competentes, as providências necessárias com vista à elaboração, até 1 de janeiro de 1993, de um vocabulário ortográfico comum da língua portuguesa, tão completo quanto desejável e tão normalizador quanto possível, no que se refere às terminologias e técnicas."
            Portugal sai na frente aprovando o Acordo pela Resolução da Assembleia da República, nº 26, de 4 de janeiro de 1991, publicada no Diário da República nº 193, I Série, de 23 de agosto de 1991. O Brasil somente o aprovou pelo Decreto Legislativo nº 54, de 18 de abril de 1995, entrando em vigor no dia 20 subsequente. 
            Esta a trajetória histórica e legal por que vem passando a sublime "Flor do Lácio", sem um só ninho e um só indez. 
            E as Leis nºs 2.623 e 5.765, de 21 de outubro de 1955 e 18 de dezembro de 1971, respectivamente, permanecem em pleno vigor. 
            A afirmativa prende-se ao fato de que decretos simples não se sobrepõem às leis. Somente uma lei derroga outra. 
            Por isso, o decreto nº 6.588, de 29 de setembro de 2008, e seu Parágrafo Único não se sustentam. 
            "Muito criticado por alguns tem sido este Acordo (1990) por não promover a unificação completa da ortografia de língua portuguesa, antes deixando alguma margem para a dupla grafia e dupla acentuação” (João Malaca Casteleiro, in Preâmbulo ao seu Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa). 
            Assim: Jerónimo/Jerônimo, falámos/falamos, dêmos/demos, bónus/bônus, trilingue/trilíngue, húmido/úmido, ab-henry/abhenry, não-agressão/não agressão, objecção/objeção, e assim por diante. 
            Onde está a união gráfica?
            E cada lusófono segue seu caminho, na liberdade que Deus lhe conferiu.

*Nonato Silva é PhD em Filologia

 

Poema
Mensagem de Natal

*Nonato Silva

Filius meus es tu; Ego hodie genui te:
Tu és meu Filho; Eu hoje Te gerei (S1 2,7)


O vagido

De um inocente,

Solitário e puro,

Faz-se ouvir

Numa noite silenciosa,

Escura e fria.

 

É o apanágio,

De um Deus-Menino,

Nascido Homem.

Os meigos olhos de Maria,

Sua Mãe,

E de José, seu Pai Putativo,

Não se cansam de mirá-Lo.

E Este Deus-Menino

Recebe o sorriso da bromélia

E o beijo da camélia em flor.

À Sua chegada,

A terra e o céu,

As ondas do mar,

E as estrelas,

Tudo embelezou

E iluminou.

E uma Donzela,

De azul e branco,

Beija o Filho unigênito

E murmura: Jesus!

Então, simpático,

Festiva e adequadamente,

Compõe-se Manuel Bandeira:

“Canto de Natal”

“O nosso menino

Nasceu em Belém.

Nasceu tão somente

Para querer bem.

Nasceu sobre as palhas

O nosso menino.

Mas a mãe sabia

Que ele era divino.

Vem para sofrer

A morrer na cruz,

O nosso menino.

Seu nome é Jesus.

Por nós ele aceita

O humano destino:

Louvemos a glória

De Jesus Menino.”

Esta é a fé cristã!

 

Nota: O professor Nonato Silva concluiu este poema em 25 de dezembro de 2010, dia de Natal

(TB30jan2011)

 

Artigo
Jornal Turma da Barra
20 anos de glória

jornal Turma da Barra

*Nonato Silva

            Diz-se, comumente, que a imprensa é o quarto poder da República. Inverto eu a frase, e digo que a imprensa, em seus diversos naipes - escrita, falada, televisiva, radiofônica, som e imagem, e eletrônica – é o primeiro poder da sociedade, de vez que a imprensa é "a vista da nação. Por ela é que a nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam, ou nodoam, mede o que lhe cerceiam, ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que a ameaça" (Rui Barbosa).
            Assim, o primeiro dever da imprensa é servir a sociedade nos seus múltiplos assentos. Não desperdiça força mental. Aguça conhecimentos. Descobre talentos. Simultaneamente, desvela e dissipa sombras. Caracteriza a arte, a educação, a literatura, a poesia. Abrange o bem geral e particular de uma sociedade. Difunde luzes. Desterra trevas e ilusões. Desestimula quem se precipita no labirinto da apatia, da inépcia e do engano. Mostra, com evidência, os acontecimentos do presente. Prognostisa os mitos do futuro.
            Tal tem sido a alma dos redatores-jornalistas, anjos titulares da verdade, munidos de uma crítica sã e construtiva. Anunciam fatos do momento e reflexões sobre o que se foi. Despertam opiniões públicas e privadas. Conjecturam, em lógica. Adoçam o amargor da verdade. Lenificam a dor. Suspendem as dúvidas.
            E digo mais. Noventa e nove por cento dos acontecimentos cabem aos editores-jornalistas - esse aguçador de epigramas, esse polidor das lâminas das concepções, das ideias e dos ideais, esse esculpidor de cabos para leitores.
            Com a palavra, ainda, a Águia de Haia: "Cada jornalista é, para o bem comum do povo, ao mesmo tempo, um mestre de primeiras letras e um catedrático de democracia em ação, um advogado e um censor, um familiar e um magistrado. Bebidas com o primeiro pão do dia, as lições penetram até ao fundo das consciências inexpertas, onde vão colaborar a moral usual, os sentimentos e os impulsos, de que depende a sorte dos governos e das nações."
            Esta, pois, a larga avenida percorrida pelo jornal TURMA DA BARRA, na pessoa de seu editor eletrônico e de seus excelsos colaboradores, em ápice de literatura acadêmica e em gomos de lisas crônicas e de gomada história, colhidos no tronco da verdade feroz.
            Como tudo o que é dito tende à consolidação dos fatos, em sua dígrafa anunciação, o jornalista, por isso mesmo, é o maior historiador do universo, uma vez que tudo o que divulga pela mídia, tem por pano de fundo a História que se desmancha e se derrama no mais profundo rigor da critica sadia e sábia.
            Assim, TURMA DA BARRA tem tido a mais brilhante carreira de história de fazer História, fruto de sua vocação primeira.
            E seu criador, diretor e editor, na têmpera que lhe é rotineira e peculiar, endoça e encampa os fulgores de uma trajetória luminosa do jornalista incomum.
            E este editor-redator-jornalista assimila todas as evoluções de uma imprensa forte e boa. Nada mais, nada menos que o jovem barra-cordense Heider Moraes, de quem muito nos orgulhamos de ser colega, em toda a virtude do vocábulo.
            Ah! Vinte anos! Vinte anos de glórias e acertos indestrutíveis, no recanto de uma ação divitíssima de grandeza nos recôncavos da sociedade.
            É este homenageado TURMA DA BARRA que amalgama a fina flor da intelectualidade literária e artística da cidade de Melo Uchoa.
            Eis, também, seu supremo editor, vivendo os epinícios de uma glória evidante, no presente e no passado, provendo os ecos de uma sociedade, em bandeja de ouro e diamante.
            Parabéns ao eterno TURMA DA BARRA e ao seu ínclito mentor!

*Nonato Silva é jornalista e PHD em Filologia Românica, residente em Brasília

(TB/1ºago/2009)