Artigo
Barra participa da Olimpíada nacional em História
jornal Turma da Barra

O Centro de Ensino Arlindo Ferreira de Lucena 
e a aprendizagem científica além da escola na 4ª Olimpíada Nacional em História do Brasil – UNICAMP

Por Luiz Carlos

            Para além dos objetivos, acreditamos que a iniciação científica pode ser assinalada por algumas características essenciais da atividade científica, entre eles podemos elencar a presença do método científico, a dimensão voluntária, a autonomia do pensamento, a busca exaustiva por problemas e soluções que geralmente não são únicas e tampouco predefinidas, a multiplicidade de fontes de conhecimento relevantes e, por fim, o engajamento pessoal e a percepção de significado por parte dos envolvidos. O Museu Exploratório de Ciências, da Unicamp (www.mc.unicamp.br), mantém dois programas que relacionam-se a essas características: o Grande Desafio e a Olimpíada Nacional em História do Brasil. Aqui entra gloriosamente o Centro de Ensino Arlindo Ferreira de Lucena, sob a gestão das professoras Libania e Osmarina e a com a orientação do professor Mestre Luiz Carlos Rodrigues da Silva, com seis equipes.
            A Olimpíada Nacional em História do Brasil ocorre sempre no segundo semestre do ano letivo e tem em 2012 sua quarta edição. Organizada em cinco fases on-line e uma última fase presencial, a olimpíada busca, através de provas e tarefas, aproximar os alunos a partir do 7º ano do ensino fundamental e do ensino médio dos procedimentos do campo de atuação do historiador.
            Mais do que avaliar os conhecimentos adquiridos na vida escolar dos estudantes, a olimpíada visa a proporcionar uma verdadeira oportunidade de aprendizagem, pois as provas oferecem uma ampla gama de documentos históricos, permitem uma discussão prolongada (cada fase on-line tem seis dias de duração) e ampliam a compreensão dos jovens sobre a História do Brasil de uma forma ativa e interdisciplinar.
            A olimpíada desenvolveu um exclusivo sistema de avaliação, no qual as questões de múltipla escolha podem contemplar diferentes níveis de acerto e de cognição. Cada questão é acompanhada por documentos históricos das mais diversas naturezas (imagens, fotografias, documentos, textos de ampla divulgação, textos acadêmicos) e por uma preocupação de diálogo interdisciplinar, com o uso de textos literários, filmes e letras de canções, de modo a refletir, a partir do cotidiano imediato dos estudantes, temas fundamentais da história nacional. Além disso, em cada uma das fases, eles realizam tarefas relacionadas às suas próprias escolas e cidades. Ao final, realizam uma prova dissertativa na Unicamp, parcialmente baseada em textos históricos fornecidos no momento da convocação.
            Em tempos de crise aguda na educação brasileira, a Olimpíada Nacional em História do Brasil vem ao encontro de atividades que sejam capazes de envolver os jovens naquilo que talvez sejam os traços mais marcantes da relação dos cientistas com suas atividades: curiosidade, inquietação intelectual e paixão pelo conhecimento.

*Luiz Carlos Rodrigues da Silva é professor do Centro de Ensino Arlindo Ferreira de Lucena

(TB11set2012)

 

Artigo
Saúde em Barra do Corda
Outro caso do descaso

jornal Turma da Barra

A reportagem do TB apurou um caso ocorrido na saúde pública de Barra do Corda.
Uma moradora do povoado Clemente, de 21 anos, grávida do terceiro filho, deu entrada no início de outubro no hospital Materno Infantil, a qual foi transferida para Imperatriz. 
Chegando ao hospital de Imperatriz, ligaram informando que ela estava com hemorragia interna. 
Drenaram dela quase um balde de sangue. Tinha 1% de chance de viver. 
Morreu deixando o marido com três filhos.


           
Ela levantou cedo de manhã, tomou banho, vestiu o melhor vestido, engoliu o café apressadamente e ainda escuro entrou no primeiro carro de linha que sai do Clemente à Barra do Corda. Chegando, entrou no ambulatório do Materno Infantil, apresentou o cartão do SUS, identidade e a carteirinha de gestante: viera fazer mais uma consulta de pré-natal. Sentou-se, suspirou e sorriu para a outra gestante ao lado, não sabia que dali a 20 dias iria morrer.
            Chegando a sua vez, entrou na sala. Examinaram-na. Estava branca, branca como o jaleco da enfermeira que lhe atendia. Verificaram a pressão: alta. A dilatação uterina: descomunal. “Que você está sentindo?” – perguntou a enfermeira.
            – Nada.
            – Dor de cabeça, tontura, cansaço...
            – Nada.
            Alguma coisa nos olhos daquela jovem gestante de 21 anos denunciava um sério problema que não passou despercebido à agudeza das enfermeiras. “Com um barrigão desse tamanho ou são gêmeos ou então uma aberração.” – pensou a enfermeira consigo mesma.
            – Vou te encaminhar ao médico e você vai dizer que está sentindo isso e isso.
            – Tá bom.
            Foi embora e nunca mais voltou.
            Chegado o dia do parto, deu entrada no hospital. A cirurgia foi aparentemente bem-sucedida. O bebê nasceu saudável. Ela é que continuou lá por mais alguns dias.
            Continuava branca, muito branca. De uma palidez cadavérica. Estava muito inchada.
            Não lhe foi passado nenhum outro exame. Nem mesmo uma ultrassonografia para tentar descobrir a razão de seu inchaço excessivo. Preocupadas, as técnicas que cuidavam dela pediram ao médico passar alguns exames. Ele requisitou um hemograma completo. O hematócrito, dizem, deu 10%. Precisava urgentemente de uma transfusão sanguínea.
            O plantão foi passado a outro médico.
            Ele tomou o resultado do exame. Olhou. Ora a paciente, ora o exame. Exaltou-se. Achou um absurdo. Dirigiu-se ao Laboratório e discutiu com o bioquímico.
            – Essa mulher não precisa de transfusão.
            Não admitindo ter sua alta competência questionada, voltou à sala e, com um olhar cruento, o dedo em riste e as veias do pescoço quase a rebentar, insultou a técnica plantonista e a própria paciente, que aguentou em silêncio.
            Os técnicos, porém, administraram o sangue sem o médico saber.
            No plantão seguinte o mesmo médico foi ver a paciente em seu leito.
            – Não falei que não precisava de sangue! Está mais rosada.
            – Estou melhor porque precisei tomar doze bolsas de sangue.
            Depois de alguns dias ela piorou. As técnicas temiam que ela explodisse literalmente de tão inchada que estava. Mais bolsa de sangue, mais furosemida. Nada de melhorar. Estava branca, branca. Impotentes diante da situação e temendo mais um óbito nas costas do hospital, propuseram retirá-la para Imperatriz. Isso foi na sexta-feira, dia 21 de outubro.
            Ligaram para a prefeitura solicitando uma ambulância. Disseram não haver nenhuma disponível. Na verdade, uma não estava na cidade, a outra estava no show do Raça Negra, para qualquer eventualidade. Conversa vem, conversa vai, acabaram por ceder a do Palácio Show.
            Chegando ao hospital de Imperatriz, ligaram informando que ela estava com hemorragia interna. Drenaram dela quase um balde de sangue. Tinha 1% de chance de viver.
            Quem está com 1% de vida não faz questão de quem o manipula. Não tem preferência, não decide.
            Quem está com 1% de vida não questiona a competência do médico.
            Quem está com 1% de vida não luta por seus direitos enquanto ser humano.
            Quem está com 1% de vida não se dá conta que tem 1% de vida, que suas pupilas estão dilatando, os lábios embranquecendo e as mãos esfriando.
            Enquanto seu coração desferia as últimas batidas, subtraindo seu mísero 1% de vida, em que ela pensava? Em seus três filhos que deixara em casa e que precisavam de seu cuidado e amor? Ou em toda uma vida que poderia ter sido e que não foi? Não sabemos. Sabemos que ela nasceu no dia 28 de maio de 1990 e que sua vida durou apenas 21 anos, deixando um marido e três filhos, sendo o mais velho de quatro anos, o outro de uns dois e um recém-nascido.
            Este não é um fato isolado, um acontecimento incomum em nossa cidade. Não foi a primeira vez que isso aconteceu. Mas este “outro caso do descaso” aqui está muito mais que apenas uma mancha escura sobre as páginas da história da saúde em Barra do Corda, aqui está, sem qualquer imparcialidade, como um urro, um sussurro, ou quem sabe um berro aos ouvidos dos órgãos competentes para que tomem as providências cabíveis.
            Poderia ter sido a história que qualquer um de nós. Nossas esposas, pais ou filhos. Nossa morte não abafaria os gritos dos que estavam no Palácio Show àquela noite, nem transformaria seu suor em lágrimas. Só que para aquela jovem mulher o show acabou. Nos botecos a animação continuou. Continuou o bate-papo nas calçadas, nas praças. Na avenida os passos tinham a mesma consistência, o destino era o mesmo.
            Tudo se processava sem se dar conta de que uma vida se findava. Contra isso não lhe foi dado lutar. Não poderíamos lutar.
            Salvar aquela vida seria mudar a ordem dos acontecimentos necessários?
            Poderia ter sido diferente? Ela tinha mesmo que ter morrido? Foi uma fatalidade? Foi a vontade de Deus? Não. Ela estava em mãos de quem tinha o devido preparo para salvá-la. Ela morreu não por falta de equipamentos necessários ou infra-estrutura adequada em nossos hospitais, morreu por falta de médicos devotados à sua profissão e ao maior bem de que dispomos – a vida.

(TB29out2011)