Aniversário
Barra faz 174 anos

jornal Turma da Barra

 

Este domingo 3, Barra do Corda faz 174 anos.
Fundada por Manoel de Melo Uchoa em 1835, tem atualmente uma população em todo município de aproximadamente 100 mil habitantes, 15 bairros, 6 vilas e cerca de 50 povoados.
Com déficit em emprego e renda, principalmente aos mais jovens,
tem graves problemas sócio-econômicos, com estradas vicinais abandonadas, educação e saúde
precisando alcançar qualidade, mesmo assim Barra do Corda situa-se entre os 20 municípios
em produção de riquezas do Maranhão.
Na região central é o que tem maior PIB (Produto Interno Bruto).
A natureza doou à cidade riquezas turísticas, potencial agrícola e devida a sua localização estratégica,
no centro do Maranhão, poderia se tornar uma cidade universitária.
Mas faltam políticas públicas, gestores e formadores de opinião com visão de futuro e, principalmente políticos comprometidos com o povo cordino.
Mas o TB saúda o fundador Manoel Rodrigues de Melo Uchoa pela fundação da cidade.
Parabéns, Barra do Corda!
NR: Este ano, o aniversário de Barra do Corda é pontuado pelo flagelo da enchente dos rios Corda e Mearim, casas que ruíram, estradas aos povoados quase intrafegáveis e pessoas em drama  e desabrigados.
 

 

ARTIGOS, CRÔNICAS, CONTOS E POEMAS

 

Barra do Corda aniversaria
jornal Turma da Barra


*Nonato Silva

Crescit eundo: “cresce caminhando” (Virgíliao)

 

            Barra do Corda, a “Princesa do Sertão”, a “Atenas Maranhense”, do zimbório de seus 174 anos de fundação, mostra quanto caminha, crescendo, imprimindo, cada vez mais, a velocidade de seu desenvolvimento cultural e artístico.
            Que o digam e repitam suas entidades de cultura, como a Academia Barra-Cordense de Letras, a Arcádia Barra-Cordense, o Instituto de História e Geografia de Barra do Corda, Casa da Cultura Galeno Brandes, dezenas de escolas em todos os graus de ensino.
            A cidade de Maranhão Sobrinho, no perpassar dos anos, acumula e soma realizações comunitárias que dignificam seus filhos ávidos de progresso.
            Barra do Corda brinca com os pés no Guajajara. Tem gosto de mato. É um poema de rimas ricas, à Olavo Bilac e Aluísio Azevedo. A loura desposada do sol, dormitando à sombra de árvores de cabelos banhados de chuva e tostados de seca.
            Assim, vai passando ao patrimônio e ao domínio da História. E uma grande História se faz com tradição e modernidade, máxime, por força da educação e do ensino que ostenta galhardamente. De uma História eril como rochedo onde não verga o tronco nem curva o topo, disposta em cimos alcandorados, sacudida de ventos e acariciada de brisas.
            Sem ti, Barra do Corda, o Maranhão envolver-se-ia em solidão, porque tu sentes e pensas, acertadamente, na virtude de tua imortalidade cívica, cultural, social, econômica e religiosa de vez que nasceste aos pés da Santa Cruz que te cobriu e amor e paz. CIDADE TÃO BEM EDIFICADA, FORMANDO UM TÃO BELO CONJUNTO (Sl 121,3). Por isso, “pedirei para ti a felicidade” (Idem ibidem).
            Nisso, és feliz, porque “quem ama encontra a felicidade e faz os outros felizes”, em vista do que a humanidade constitui a base de todo o teu adiantamento, incorporando o que foi duro de sofrer é doce de recordar, avaliando-se que a tua vida útil é uma eterna primavera.
            Tudo, graças ao caráter de teu povo ordeiro, trabalhador, honesto, ético, porque “a moral ensina viver” (Joubert).
            Pode, no entanto, haver cizânia, em face do que “não há homem que não encerre em si o gérmen de um santo e de um celerado”, no pensar de Lacordaire. E este maior orador sacro francês de todos os tempos, cuja voz ainda hoje ecoa nas arcadas de Notre Dame, assim pontifica: “Uma alma é, por si só, um grande povo”.
            Pois o “caráter é a energia surda constante da vontade, a inflexibilidade ainda maior na fidelidade a si mesmo, às suas convicções, às suas amizades, às suas virtudes, uma força íntima que se desprende e inspira a todos a certeza que nós chamamos segurança. Pode-se ter espírito, ciência, mesmo talento genial, e não ter caráter” (A Águia de Maux).
            Mas o barra-cordense tem caráter, e muito, porque avança e supera todas as vicissitudes.
            Salve, Princesa do Rio Corda!
            Parabéns!

*Nonato Silva, 90 anos, é o maior intelectual vivo barra-cordense, mora em Brasília.

 

 

Crônica histórica
O homem que amava
Barra do Corda

jornal Turma da Barra

*Álvaro Braga

            Inicio esta crônica, comemorativa aos 174 anos da fundação de Barra do Corda com um trecho da música imortal do maestro Moisés da Providência Araújo com letra de Olimpio Martins Cruz, a Canção Cordina:

“Barra do Corda, amor de minha vida
És tudo para mim, terra querida,
Teu róseo coração,
Tens em teu seio um mundo de poesia,
Tens o aroma das selvas, tens magia,
Princesa do sertão.”

            Escolhi o estribilho da belíssima canção para servir de mote a um homem que tinha a cidade e sua história entranhada em seu corpo, em sua alma e em seu nome. Este homem amou verdadeiramente Barra do Corda, sua gente, suas ruas, seus rios. Nasceu em Barra do Corda. Viveu em Barra do Corda. Respirou 79 anos o ar de Barra do Corda. Morreu em Barra do Corda. Doente e paupérrimo, como seu bisavô, MANOEL RODRIGUES DE MELO UCHOA, o cearense fundador de Barra do Corda, no exato dia 3 de maio de 1835.
            Nada melhor do que homenagear, neste mágico dia, que toca o coração de todos os barra-cordenses e os aqui radicados, a figura de José Maria Uchoa e de seu irmão Manoelzinho das Varas, não só pela lembrança e herança direta do nosso fundador, mas também pelo exemplo de humildade de suas vidas, que constituiu um verdadeiro legado cristão para as gerações futuras. Eis:
            JOSÉ MARIA DE MIRANDA UCHOA, bisneto do fundador Melo Uchoa, era filho de Belisária César de Miranda Uchoa, e irmão de Manoel Miranda Uchoa, o conhecido e folclórico Manoelzinho das Varas. Tinha ele vários apelidos como Zé Beliza, Zé Margarida, Lápo, Ápo, José Maria Uchoa, Melo Uchoa ou simplesmente Uchoa.
            Sobre ele escreveu o historiador barra-cordense Justino Soares de Abreu: “Uchoa, bisneto do fundador era homem direito, simples, humilde, muito inteligente, não suportava injustiças. Capaz de falar em público por horas a fio, discriminando alguma coisa sobre o passado de Barra do Corda. Com seu espírito de humildade, saia com seu irmão de porta em porta, aos sábados, dizendo em voz um pouco alta :- Uma esmola para o Manoel! O Manoelzinho era paraplégico, andava seguro em dois bastões, fazendo rastros, pés descalços, sem levantar os pés .Cego de nascença, era homem de muita fé. Todos os dias assistia às funções religiosas .Trazia no pescoço toda a sorte de rosários e adereços católicos.Ia à igreja todos os dias, sem faltar nenhum. Um dia o frade disse no sermão: Esse ceguinho quando morrer seus olhos abrirão! Manoel nasceu em 22.09.1887 e faleceu a 03.08.1954.” Estes fatos também estão descritos no livro de Galeno Edgar Brandes – Barra do Corda na História do Maranhão.
            Eliézer Moreira Filho, em seu livro Memórias de Meu Tempo cita ipsis literis:”…Na beira do Rio Corda, na Rua Pedro Braga, morava um deficiente físico, o Manezinho, que era bisneto de Melo Uchoa, o fundador da cidade e irmão do referido José Maria Uchoa. Era cego, aleijado, arrastava-se mais que andava apoiado em dois pedaços de paus que, à guisa de muletas, o suportavam e ajudavam a equilibrar-se.
            Diariamente, lá pelas quatro horas, ao primeiro toque dos sinos, dos três que anunciavam a missa das cinco horas da manhã, ele saía de casa arrastando-se para a igreja da Matriz localizada à época no centro da Praça Melo Uchoa.O seu itinerário passava pela casa do velho Bandeira na rua Formosa que, já acordado, ao ouvir o “toque-toque” das muletas no chão, abria a janela e o cumprimentava:
            “Ô diabo diô! Eh Manézinho, aonde tu vai? – Eu vou pra missa, seu Bandeira, p’ra ir p’ro Céu, respondia Manézinho.
            Pra missa? Oh cruz diabo.
            …E se não houver Céu: Oh bombada!!”, dizia o velho Bandeira referindo-se ao esforço diário que o Manézinho fazia para assistir a missa em busca do Céu.
            Muito jovens, ainda na puberdade, fazemos coisas que depois nos arrependemos. Mas é tarde. Resta nos penitenciarmos dos erros cometidos, com uma sensação de culpa irremediável. É ainda sobre Manezinho. Sabíamos que ele começava a se deslocar para a igreja na primeira das três batidas do sino que chamava para a missa das cinco horas da manhã.
            Penetrávamos na velha igreja matriz, que se situava no centro da atual Praça Melo Uchoa, e à meia noite tocávamos o sino, como se chamando para a missa. Aí ficávamos à espreita esperando Manezinho chegar se arrastando para a missa que só aconteceria cinco horas depois. Isso era de uma crueldade inaudita. Mas na nossa irresponsabilidade juvenil, era apenas mais uma brincadeira.”
            Sobre o Uchoa o mesmo Eliézer Moreira Filho diz: José Taveira e Uchoa, trabalhavam juntos na Colônia Agrícola Nacional do Maranhão - CANM, mas viviam em conflito. Meu pai, quando soube disso separou-os. Uchoa foi tratar do arreamento dos animais – selas, rédeas, bridas e outros apetrechos dos equinos que a Colônia dispunha. Quando seus colegas estranhavam não estarem mais trabalhando juntos, ele respondia: “Melhor trabalhar com burro velho do que com velho burro”, referindo-se ao Seu Taveira.
            O poeta Olímpio Cruz, em carta a Justino Soares de Abreu, datada de 30.10.1973 diz textualmente: “Contudo,no meio dessas alegrias, também a sua carta trouxe-me a tristeza da notícia da morte de um dos meus grandes amigos que deixei em minha querida terra, JOSÉ MARIA DE MIRANDA UCHÔA, o velho filósofo Uchoa, um diamante encapado junto à lama e o pedregulho da rua do BQ… (Buraco Quente – cabaré - Nota do Autor) o popular Zé Margarida, verdadeiro pária que passou pela vida, pregando a justiça, o bem, a paz e o verdadeiro amor de que tanto nos fala S. João Evangelista: “Filhinhos, amai-vos uns aos outros”! Embora o sábio Uchoa fosse um homem humilde, muitas vezes mostrava-se quase rebelde, diante das injustiças a que assistia e outras vezes as sentia na própria pele…Mas, resta-nos apenas rezarmos pela sua alma boa de quase santo e completo mártir pela doença e pela pobreza durante uma vida de quase oitenta anos. Quando aí eu chegar se Deus quiser irei no seu túmulo depositar não somente a flor de minha saudade, mas, também rezar-lhe um Pai Nosso bem perto dos seu restos mortais, para que o seu espírito sinta de pertinho a presença de um amigo que muito lhe o quis.”
            Denis Milhomem Arruda, filho de José Nogueira Arruda, o Zezé, e Dona Guaracy falou certa vez que o “Ápo” tomava sete cafés da manhã todos os dias. Cada café em uma casa diferente, tal era a sua peregrinação diária pela cidade e o carinho e o respeito que todos lhe devotavam. Gostava de surpreender os amigos com “cutucões” inesperados e exclamando a célebre palavra: Lápo!
            Uchoa era muito amigo de Sidney Milhomem, de quem era parente. Dessa amizade, com o passar dos anos surgiu a idéia de Sidney registrar em livro todas as histórias que José Maria Uchoa contava por horas a fio sobre a fundação de Barra do Corda e a saga do fundador Manoel Rodrigues de Melo Uchoa. O livro foi publicado em parceria com seu primo Ismar Gonzaga Roland, com o título: Barra do Corda – Sua História. Na introdução, o livro narra textualmente: “ – Para falar de sua fundação, ninguém mais autorizado do que José Maria de Miranda Uchoa, velhinho com ares de Diógenes, tal seu espírito filosófico e boêmio. Possuidor de sólida cultura livre, Uchoa, como era conhecido, era bisneto de Manoel Rodrigues de Mello Uchoa, o fundador.
            Falecido a 14 de outubro de 1974 (ficamos com a data de 14.10.1973 que está escrita na cruz, sobre o seu túmulo), Uchoa teve o cuidado de narrar a Sidney Milhomem, com muita riqueza de detalhes com lances de aventura e romance, a verdadeira história de Barra do Corda.”
            Sidney Milhomem era uma das pessoas que Uchoa mais confiava, para ser o redator e escrivão de suas cartas dirigidas a vários cientistas, entomologistas e apicultores de renomadas Universidades brasileiras, pois o velho Uchoa era chamado por eles de “colega”, tal era a sua sapiência sobre a natureza, em sua forma mais elementar, dominando mais especificamente o conhecimento sobre a vida das formigas e das abelhas. Era comum vê-lo pela cidade com pedaços de colméias e insetos, os mais variados, como coleópteros e borboletas de todos os tipos e matizes.
            Dona Clélia Franco Milhomem, viúva de Sidney relembrou que José Maria Uchoa falava que o fundador Melo Uchoa ao chegar à Barra do Corda e depois encontrar o amigo alferes Raimundo Manoel Maciel Parente, (que também buscava descobrir um local no centro maranhense propício a se erigir uma cidade) confraternizou com o mesmo, com uma bebida chamada “jacuba”, que era uma mistura de rapadura moída, água e um pouco de farinha. Uchoa, continua Dona Clélia, tinha verdadeiro horror à política feita de modo rasteiro. Inteligente como era, era também um crítico mordaz, e costumava dizer o seguinte: “- Deus te livre do mal vizinho, da cobra que se esconde na poeira do caminho e da Muquerquina!” E explicava que Muquerquina é essa política doentia, que não gera nada, só gera conflito, igual a Muquerque! Nunca se soube a quem se referia. Talvez fosse uma figura de linguagem criada por ele pra poder expressar essa idéia. Outra frase costumeira de Uchoa, proferida empunhando sua bengala e tocando levemente a cabeça do seu ouvinte era: “- Comunista, pau na crista!”
            Carlile Brandes, o irmão mais novo de Galeno Brandes revela que Uchoa costumava dizer: “ – José Maria de Miranda Uchoa, mais nome do que pessoa!” Essa frase encerrava em si uma verdade e uma crítica à sociedade que o rodeava.
            Abraão Martins Jorge, o “Mestre Abrão” também puxou pela memória e lembrou que o Uchoa falava que a política na Barra era como pinico, mudava o “recheio”, mas o vaso era o mesmo.
            Luis Edmo Braga Milhomem, o Braguinha, dá a sua contribuição, retirada de velhas lembranças: “ – O Zé Maria Uchoa tinha uma espingarda velha que um labigó cismou de usar para fazer uma casa de barro dentro do cano. O Uchoa não sabia disso e uma vez inventou de dar um tiro. A arma explodiu na cara dele. Lascou o cano e o Uchoa quase morre. Passou muito tempo doente por causa disso!”
            Dona Maria Rosa, irmã de dona Rosita Pereira Falcão, citou uma parábola muito usada pelo Uchoa, que certa vez plantou uma caroço de manga espada, no quintal de sua casa na rua Pedro Braga. Quando a mangueirinha estava com o caule já em crescimento, o Uchoa, na presença de algumas pessoas simplesmente “deu um nó” na haste da plantinha ainda em tenra idade, o que admirou a todos.Ele explicou filosófico: “Uma criança é como essa plantinha. A gente prepara ela como a gente quer, mas depois que cresce não adianta mais!”
            Fui conferir lá na rua Pedro Braga, próximo ao Porto das Almas, no rio Corda. A mangueira sobreviveu ao experimento e ainda existe, apresentando inclusive uma espécie de deformidade em seu tronco, a três metros do solo. A manga, tipo espada, é de um adocicado saborosíssimo.
            Antônio Cordeiro, ex-secretário da Prefeitura Municipal de Barra do Corda e ex-administrador do INCRA também foi uma das pessoas muita amigas do Uchoa e que por muitas vezes datilografou as histórias e narrativas que ele tinha de memória sobre a fundação de Barra do Corda e toda a saga do cearense Melo Uchoa.
            Rubem Fialho, em depoimento rico em detalhes falou que o Uchoa era um grande amigo e um filósofo. Uma vez, ao ser indagado sobre o tipo de poesia que gostava respondeu: “- Só gosto de poesia lógica!” Recitava de cor as poesias As Pombas e Mal Secreto, ambas de Raimundo Correia.
            Na data de 25 de fevereiro de 1966, o então prefeito Galego Edgar Brandes sanciona um Decreto Municipal que inclui José Maria Miranda Uchoa no quadro dos inativos da Prefeitura Municipal de Barra do Corda, considerando que ele era um autodidata, descendente direto do fundador da cidade e completamente desamparado em matéria de uma Previdência Social que lhe garantisse subsistência digna ao final de seus dias.
            Muito amigo também do casal Galeno Edgar Brandes e de dona Alda Lopes Brandes, Uchoa dizia que “Barra do Corda era um monstro adormecido, veio Galeno Brandes e o despertou para ser triunfante e vitorioso”, relembrou dona Oclair, viúva de Moreno Queiroz. À dona Alda confidenciou que o apelido Zé Margarida foi adquirido por causa de uma amor que teve em sua mocidade, uma moça chamada Margarida. Dona Alda prometeu a ele, caso que ele morresse primeiro, ela depositaria uma margarida em seu túmulo, o que se confirmou em 1973.
            O casal Galeno Brandes providenciou também o túmulo de José Maria Miranda Uchoa, que repousa no cemitério Campo da Paz. Na cruz de seu túmulo constam as seguintes datas: Nasceu em 22.10.1894 e faleceu em 14.10.1973 ás vésperas de completar 79 anos.
            Para finalizar, recorro à prodigiosa memória do Uchoa, que no mesmo livro Barra do Corda – Sua História, narra ao Sidney Milhomem o diálogo de seu antepassado Melo Uchoa e o amigo Maciel Parente, que faziam um brinde com a bebida jacuba na confluência dos rios Corda e Mearim:
            “Maciel Parente: - Colega, contemplemos, pelo muito de simbólico que existe neste brinde – a beleza da natureza, no amplexo fraterno destas duas caudais irmãs!”...Mello Uchoa, visivelmente emocionado pelo ato exclamou: “- Companheiro, a Deus onipotente que presencia esta cerimônia singela, rendo-lhe graças pelo nosso encontro e peço que oriente a todos aqueles que vierem a habitar nossa futura cidade, que coexistam pacificamente, com o objetivo único de atingir sua verdadeira grandeza político-econômico-social”.

*Álvaro Braga está escrevendo um livro com fotos históricas de Barra do Corda

 

 

Princesa do sertão?
jornal Turma da Barra

*Urias Matos


            Vista do alto do mirante do calvário, a “princesa do sertão” permanente indolente, bela e acariciada pelas águas do Corda e do Mearim, que em seu seio se abraçam e se juntam, indo desaguar-se nas águas do oceano.
            O Mearim, mais forte e bravio, consome aos poucos o Corda, até que a barracenta e morna temperatura de suas águas dissolve a limpidez e a friúra do vencido.
            Decantar as belezas naturais  de Barra do Corda é tarefa simples, são rios, riachos, cachoeiras, prédios centenários, aldeias indígenas e muitas, mas muitas histórias para contar ao longo dos seus 174 anos de existência completados nesse domingo.
            Paralelo a isso, é por deveras simples perceber seus seculares problemas, por gerações acompanham a velha senhora, outros como a falta de água e a violência anacrônica são recentes, mas todos têm um fruto único, a incompetência de seus administradores.
            Barra do Corda nasceu para ser grande. Fruto das incursões de Melo Uchoa pelo sertão maranhense, a história da fundação da cidade virou lenda, mas seus destinos desviam-se de rumo a cada geração.
            Para os mais velhos a cidade tem o não tão pomposo título de “cidade do já teve”, numa alusão aos vôos semanais que ligavam a cidade ao resto do país, hoje o aeroporto não recebe nenhuma aeronave pois a pista está em ruínas, embora a entrada tenha sido maquiada pela Prefeitura. A perda do posto da Receita Federal para Presidente Dutra, fruto da falta de compromisso de nossos políticos com a cidade, entre outros tantos exemplos que me falta á memória.
            Mas, o pior estaria por vir. Enquanto cidades como Pedreiras e Grajaú receberam campus da universidade federal, nossos representantes políticos preferiram trocá-los por cargos políticos, para nossa tristeza, chegamos a ter numa mesma legislatura quatro deputados estaduais, nenhum com capacidade ou desejo real de cobrar veementemente um campus de universidade para nossa pobre “princesa semi-analfabeta do sertão”.
            A cidade, a despeito do poder público cresceu e com eles um problema inusitado e absurdo para um lugar que poderia ser chamado de paraíso das águas, pois além dos dois rios que cortam a cidade temos um rico lençol freático por baixo de nós, mas, quase todos os dias a água desaparece de nossa torneira.
            Há cerca de 12 anos atrás foi implantado um sistema de abastecimento de água que substituiu os eficientes postos artesianos que supriam a demanda da cidade pela canalização e tratamento de água do rio Corda, o resultado foi um desastre, não porque a água do rio fosse incapaz de abastecer a cidade, mas sim porque parte dos recursos foram desviados para a campanha de políticos que hoje ainda permanecem no poder, e que ainda usam a desculpa de que o abastecimento de água da cidade é de responsabilidade do governo estadual, federal e até da NASA, a Agência Espacial Americana que por aqui não distribui as pílulas de água, que cede a seus astronautas em viagens espaciais, assim vive o povo  da “princesa sequiosa do sertão”.
            Paralelo a isso, os donos do poder esbanjam sede de tê-lo mais ainda. A cada dia novos empreendimentos, novas construções, novos veículos, alguns importados, enquanto a periferia padece de fome, sem emprego, os jovens descambam para a marginalidade e violência também pela falta dela, pela falta de perspectivas, de programas de geração de emprego e renda de educação de qualidade, de um rumo.
            O rumo dos filhos dos donos do poder porém está traçado, uma cadeira numa faculdade particular na capital e uma herança polpuda herdada do desvio dos louros gerados por uma “princesa esquálida, com sede, asselvajada, e sem esperança do sertão”, não apenas com sede de água e de conhecimento, mas completamente afluente de total comodismo, afeita a aceitar tudo brandamente como um ditame divino, como um escravo ou rés, sem nenhum esboço de revolta ou desassossego, a não ser aquela manifestada nos
bares e nas esquinas, mas que minutos depois se dilui como que por efeito do sol abrasador.
            Pobre princesa do sertão, que tomou para si erroneamente o título da terra Caxias de Gonçalves Dias, essa sim princesa, aqui, somos apenas escravos de nós, de nossa consciência, de nossa inércia que hoje completa 174 anos.

*Urias Matos é poeta e escritor, mora em Barra do Corda

 

 

Barra setenta
(À sombra da memória)
jornal Turma da Barra

*Francisco Brito


Anos setenta ainda sinto
no colo presente da lembrança,
sóis radiantes nos céus azuis

                                               muito se ressentem.

Caudalosos e perenes rios.
Rio da minha infância
 

do mandi, do piau, do surubim.

Era o mês de maio
na terra de Melo Uchôa,
vívido primeiros desejos
doces dos lábios inocentes

                                               da linda pele branca
                                               de olhos negros.


Ah, revoadas de sonhos...
Os vin-vins, suro, pião,
peteca, bola de mangaba,
passatempos prediletos.

                                               sem vídeo, sem áudio, sem tecla.

Havia um sítio, (não americanizado)
Mas, sim dos ingleses! Boa educação.

                                               Amém!

Barra e Corda. Não o rio, mas, a cidade.

- Ainda corre viva dentro de mim!

 

*Francisco Brito de Carvalho é escritor e poeta, mora em São Luís (MA)

 

 

Dura realidade
jornal Turma da Barra

*Alex Macedo

            Uma cidade centenária. Seus olhos pareciam querer eternizar cada detalhe. Os paralepípedos nas ladeiras o remetem à infância. O ar parece impregnado daquele cheiro de outrora. E ainda tinha o rio. O barulho das águas como que puxasse uma melodia que o jovem não ouvia há anos...
            Como numa viagem psicodélica, tudo o levava a tempos remotos. Já não diferenciava os traços do presente com a velha cidade de sua infância, que agora renascia diante de seus olhos, nas formas das pedras e casas históricas do centro da cidade.
            Numa perturbação de sentimentos, já não sabia se vivia no presente ou se retrocedera ao passado. Havia algo de errado. Estaria louco? A saudade da cidade de sua infância o fez perder o senso da realidade.
            Mas se estava na velha cidade de sua infância, onde estariam os amigos? Imaginava-os bem-sucedidos. Lembrou-se de que todos foram se tornando exilados em outras grandes cidades. Ele próprio era universitário.
            A cidade de sua infância não possuía universidades. Notara o detalhe. Voltava, pouco a pouco, a ter noção da realidade. Que cidade era aquela? Quantos anos ela teria? Centenas, imaginou, observando monumentos de alguns séculos atrás. Mas tinha aquele detalhe que o incomodava: as universidades.
            Lembrou-se de que a cidade de sua infância ficou para trás pela falta de universidade. E assim permanecia, depois de alguns anos corridos. Os amigos se comunicavam com ele, lembrara. Informaram-lhe que cidades vizinhas já contavam com os “templos do saber”. A cidade de sua infância continuava bela em sua memória, pois fazia questão de lembrar dela até o momento de quando ela não precisava satisfazer algumas necessidades cruciais, como oferecer-lhe uma universidade.
            A sobriedade foi retomada. A realidade mostrou-se dura. O Jovem preferiu manter-se ébrio.

*Alex Macedo é estudante de História da Universidade Estadual de Goiás, mora em Inhumas - GO

 

 

Barra do Corda: 174 anos
jornal Turma da Barra


*
Natanael Maninho


Barra do Corda, tu és minha porra.
Como dizia o saudoso Luis Campeão.
Que já não vive em nosso meio
Mais vive em nosso coração

Minha querida Barra do Corda
Pra sempre serás minha
Mesmo se eu tiver tão longe
Tu és pra sempre minha rainha

Em Barra do Corda nasci
Em Barra do Corda fui criado
Como posso me esquecer
Desta linda cidade, onde fui educado

Com dois maravilhosos rios
Que cortam o centro de cidade
Quando me lembro de suas belezas
Não me contento de tanta felicidade

Com 174 anos de vida
És pra sempre do meu coração
Feliz aniversario Barra querida
Princesa do sertão  

*Natanael Maninho Tavares Leite Junior é poeta, mora em Barra do Corda

 

 

Memórias de Barra do Corda
jornal Turma da Barra


*Renilton Barros

Barra que canta e encanta
Cidade que não é o Rio, mas é maravilhosa
Pintada entre o verde das matas
Localizada no Centro Sul do Maranhão
E construída ao longo de dois rios
Formosa és aos olhos dos filhos teus
Fonte de inspiração para os teus poetas.

Cidade que é em tudo poesia,
Margeada por Corda e Mearim
Ora tranquilos, ora bravios
Entoados em cantigas e canções
Relatam tuas belezas naturais
E que levam em suas águas a alegria
das almas daqueles que em vós se deleitam.

Cidade mais que centenária, Centro.
Cidade altaneira, Altamira
Cidade do outro lado do rio, Tresidela
De tantos bairros crescentes com o progresso
Que te fazem crescer e ser grande
E como o tempo, contas os anos a passar
Pois já passaram 174 anos desde o teu nascimento.

Cidade das altas amendoeiras nas ruas e praças
E de cocos babaçus em seus roçados
Das Luas Cheias, de sonhos e brilhos.
Do manto céu estrelado a contar tua história,
História de luta na persistência de tua existência
Contada no histórico de vida de cada um de nós
E eternizada na memória e na voz de teus filhos.

Cidade florida de ipês, malícias, jitiranas...
Plantadas ou nascida ao relento
E que enfeitam jardins, matas e os meses da primavera
E também de frutas, croatás, guabirabas, sapucaias...
Plantados ou não, colhidas ao seu tempo ou temporãs
Que fizeram e ainda fazem parte das nossas vidas
No doce cheiro e sabor da dileta infância.

Cidade de lutas, em que a fadiga da vida
A tinta dos poetas converte em poesia.
São tantos os versos, que vejo tal qual um garimpo,
Transformando a pedra bruta em ouro polido
E assim consegues impor teu valor
E as distâncias espaciais não suplantam as emocionais
Apenas aumenta ainda mais a dor da saudade.

Cidade encantada de aurora resplandecente
De céu azul anil nos dias quentes de verão
Cidade em que a tarde debruça sobre as pontes
E sob o olhar paciente, vislumbram o sol
E o poente anunciando o entardecer.
E nós que a pesar da distância
Não conseguimos esquecer.

Cidade alegre com suas festas mil
Cidade das ruas de pedras traçadas
Substituídas, é verdade, pelo tal progresso
Cidade sombreada pela igreja matriz
Cidade de povo que luta, trabalha e fala o que diz.
São teus filhos “terra adorada”,
Que desejam ver-te sempre feliz.

            Desejo que a nossa cidade, com suas belezas naturais, continue linda dentro de cada um de nós, procurando sempre o desenvolvimento em todas as áreas, de forma inovadora e criativa, educando as crianças em direção a um futuro promissor e sustentável.
            Desejo ainda que as ações empreendedoras e governamentais de quem de direito, sejam constantes no dia-a-dia desta cidade para o seu pleno desenvolvimento.
            Parabéns! Barra do Corda.

*Renilton Barros é poeta e cronista, mora em Brasília

 

 

174 anos de Barra do Corda
A cidade abandonada

jornal Turma da Barra


*Cezar Braga


            O editor do TB nos lembrou de escrever sobre os 174 anos de Barra do Corda, e nos pediu que antecipássemos as matérias.
            Resolvi escrever meu artigo neste 21 de abril, dia de Tiradentes, o herói da Inconfidência Mineira.
            Polêmicas à parte, sendo Tiradentes herói ou não, a Inconfidência Mineira me inspirou para escrever este artigo, afinal estamos precisando de uma Inconfidência Barra-cordense... Quiçá encontremos nosso inconfidente-mor.
            Nas últimas décadas Barra do Corda perdeu força econômica em um ritmo inacreditável. De uma das melhores cidades da região, por administrações normais (no sentido de eleitas democraticamente) e incompetentes, estamos sendo ultrapassados por quase todos os outros municípios vizinhos.
            Com a nova crise, já beirando a uma recessão mundial, se o novo modelo administrativo seguir os antigos, teremos um caos econômico e um futuro desastroso.
            Em fevereiro, por ocasião do carnaval, fiquei extremamente decepcionado com minha cidade, diria até envergonhado, pois parece uma cidade abandonada, sem administração, as ruas - se é que podemos chamar de ruas - todas esburacadas e com mato cobrindo o que resta de asfalto, muitas parecem até trilhas… É triste demais chegar e se deparar com tamanho abandono.
            Mas, quando digo que precisamos de uma inconfidência, não me refiro a este abandono físico, que já é característica da minha cidade e de suas administrações caóticas e irresponsáveis. Administrações que nem sempre espelham a vontade de seu governante, mas quase sempre a ganância de seus familiares.
            Como dizia, o que me leva a conclamar uma inconfidência é a falta de sensibilidade dos políticos que hoje mandam, desmandam e destroem a Barra do Corda, em relação à instalação de uma universidade federal, ou, no mínimo um campus avançado da UFMA.
            Barra do Corda, além de uma localização privilegiada, tem um potencial turístico invejável, que aos poucos vira um deserto turístico, já que nem a natureza agüenta tanto descaso.
            Nossa cidade tem sido vilipendiada e maltratada há anos. O que se caracteriza como afronta ao bom senso e ao juízo, principalmente o juízo, pois é o mínimo que podemos esperar daqueles que administram cidades com gente dentro.
            Nossos políticos, do alto de sua prepotência acham que, ao se elegerem tenham recebido carta branca do eleitor. Ledo engano.
            Com certeza, atrás da trincheira da civilidade e do amor à sua terra, encontram-se obstinados, cabeçudos e teimosos, com aguçado senso crítico e prontos para reconhecerem desvio de rota, leniência, desídia.
            Chega de teatralidade. Queremos realidade construtiva, alvissareira e que garanta o futuro de nossa terra e as aspirações de nossa gente. O tema que desponta como de grande importância no momento, que deve ser tratado com seriedade e que precisará de acompanhamento “técnico, estratégico e político” é a instalação de Campus da UFMA na nossa querida Barra do Corda.
            Nestes 174 anos, queremos desejar à Barra do Corda e a todos seus habitantes, admiradores e apaixonados que os nossos políticos adotem uma postura de compromisso, seriedade e consciência cidadã, em substituição a prepotência, a arrogância e a indiferença pelos problemas dos barra-cordenses.
           
Oxalá tenhamos muito a comemorar nos 175 anos da nossa querida e sofrida Barra do Corda.

*Cezar Braga é escritor barra-cordense, mora em São Luís

 

 

Barra do Corda
3 de maio de 1835 - 3 de maio de 2009
174 anos de (in)temporalidades

jornal Turma da Barra


*Professor Luiz Carlos


O teatro era o nome desse incêndio,
Mas alguém dizia que era também a imagem parada
Onde há muito a Urbe se perdera
Nas cortinas velhas, desfiguradas e tempestuosas de uma longa e histórica noite.
 

            Sempre senti, desde a minha adolescência, que Barra do Corda  era assinalada por uma angústia (in) temporal oriunda do extremo do universo. Não é, obviamente, um sentimento que se assemelhe com o pasmo poético dos abismos insondáveis caxiense, das orlas mágicas meridionais ludovicense, ou dos cumes do Sertão maranhense. Mas desde sempre reconheci, no mais recôndito crivo da minha consciência, que essa característica existia por trás das inevitáveis vestes épicas ou insignificantes com que as gerações de todos os presentes se auto-representam.
            Uma geração, dentro dos parâmetros sociológicos, aspira incansavelmente ao ápice da história e faz da sua coreografia, da sua espacialidade, da sua identidade cultural, da sua Urbe e da sua terra o lugar desse cerimonial singular. Esta desfocagem dos autóctones é universal, mas Barra do Corda, por motivos pragmáticos e históricos, é, por trás da letargia e orgulhos fáticos, uma cidade singular, particular.
            Barra do Corda é uma Urbe que, como todas, se particulariza no tempo em contraste com a parcialidade das gerações e com as morfologias do território. Grande parte do que a Ube é e vai sendo, na sua caminhada entre (in)temporalidades, faz parte inequívoca do que se podia ser designado pelo seu horizonte secular.
            Por isso a Urbe Barra do Corda, nesses 174 anos ali está, habitada pelo seu espaço, presente, posicionada e aparentemente incólume, e, ao mesmo tempo, tão terrivelmente senhora de si mesma e da sua quase( in)temporalidade. E por isso Barra do Corda ergue-se diante de nós, como se nada fosse ou pretendesse ser, ou pretensamente não dito do seu encanto, assim como uma parte pungente daquilo que Borges designou por desilusão na sua História da Eternidade.
            De algum modo, de forma enigmática, a Urbe de Barra do Corda é propensa à desestruturação, ao spleen da imobilidade, à volúpia insaciável e à angústia desmedida do desejo, já que nela domina a tentação de levar a cabo a releitura (que não quer silenciar) dos seus textos presentes no seu patrimônio arquitetônico tão vilipendiado, imaginários, passionais e espaciais, num movimento concomitantemente ascendente e descendente, e que visaria, num só plano, tanto os rastos, as ruínas e os vestígios, como as presenças, as ausências, o agora-aqui e o emergir às vezes informe do próprio discurso contemporâneo (que é o nosso).
            Barra do Corda também tem uma herança eclética e holística, é verdade. Reduto, afinal, da sua capacidade de permanecer nas (in)temporalidades.

*Luiz Carlos Rodrigues da Silva, 46, filósofo e historiador, mora em Barra do Corda e é membro da ABC (Arcádia Barra-Cordense)

 

 

Feliz aniversário
jornal Turma da Barra

*Humberto Madeira


            Fui criado na rua da Tripa, subi a torre da Igreja, pulei o muro do Seminário para comer manga, corri com medo da cadela ‘perigosa’, joguei bombinhas na Igreja na Copa de 1986, escalei a gruta atrás da igreja Matriz, ajudei a ornamentar a Tripa com palha de arroz para a semana santa, joguei futebol no campinho do lixo, era o batedor oficial de pênaltis do time, me considero um bom tripense.
            Era tudo muito diferente, sem maldades. Lembro quando o parque chegava, era notícia. O ano todo era esperado para a época dos festejos de dezembro, a Melo Uchoa era o cenário, nós éramos apenas coadjuvantes dessa linda história. O chá de burro, as brincadeiras, a pipoca e a inocência talvez fossem os atores principais.
            Lembro minha primeira expedição ao Sujapé, fomos de bicicleta. A Altamira era o lugar mais longínquo daqueles jovens tripenses. Logo veio a escola, do Maranata fui ao Diocesano onde passei uma década.
            É dessa Barra do Corda que sinto saudades, sem violência, sem assaltos, sem violações.
            A infância hoje parece ter saltado algumas etapas, alguns anos, quem sabe décadas. Escrevendo este artigo, fecho os olhos, lembro das competições na praça, do bater dos sinos, é hora da missa, ouço a voz do frei Luizão, do carinho com cada um de nós.
            A cidade se transformou, são mais de 15 bairros, a população cresceu. Os índices de violência aumentaram significativamente, é o preço que temos que pagar com a chegada do tal desenvolvimento?
            Ao entrar em bairros da periferia vemos jovens tatuados, fumando, venda de bebida descontrolada. Pequenos lugares em que a droga e o álcool são constantes.
            Mas ainda assim, gostamos e guardamos com carinho a forma que essa cidade nos presenteou com uma infância sem medo ou riscos. Por isso voltamos, pelo amor criado, cravado no peito, da saudade que dói, da família que ficou, dos telefonemas longos, das notícias de casa, dos amigos, da própria cidade, do cheiro característico, dos rios.
            Hoje completamos mais um ciclo, mais um três de maio chegou. E de longe, como todo bom barra-cordense estou a comemorar, é como se fosse o meu aniversário.
            Parabéns Barra do Corda, que tu possas proporcionar a muitos o que tu destes a mim. Devo a ti esta influência pelas letras, pelo o amor à leitura e capacidade de escrever, de manifestar o que gostaria de dizer para ti, ai de perto: saudades, feliz aniversário.

*Humberto Madeira é estudante de Medicina, mora em Cochabamba (Bolívia)

 

 

Melo Uchoa:
a praça do povo

jornal Turma da Barra


*Márcio Melo


            Em primeiro lugar, quero parabenizar e dizer que amo minha cidade: Barra do rio Corda e do Mearim, do morro do Calvário, da praça Maranhão Sobrinho, da Altamira, Tresidela, Incra, Araticum, Tamarindo, Sítio, Cohab, Pequizinho, Nossa Senhora das Dores, Vila Nair etc.
            Se em Salvador a praça Castro Alves é do povo, em Barra do Corda a praça Melo Uchoa também é do povo. Localizada na parte central da cidade com seus traços e curvas bem desenhados, bem arborizada e com seus canteiros verdes, tendo bem em frente à igreja Matriz que a torna ainda mais encantadora.
            Ali é o coração da cidade. É por isso que a Melo Uchoa é o principal ponto de encontro da juventude, além de ser um belíssimo ponto turístico, que disponibiliza para a população amplo espaço para o lazer, dando mais qualidade de vida para os barra-cordenses.
            A praça Melo Uchoa é de todos: crianças, jovens, adultos, velhos, ricos, pobres, intelectuais, mestres doutores...
            Ela é testemunha de centenas de casos de amores, de várias gerações e de muitos encontros, desencontros e de várias paixões.
            Nela podemos encontrar vários amigos, ouvir o sino da Matriz, o canto dos pássaros, o bate-papo, feira de artesanato no final de semana e várias manifestações culturais, entre outros.
            Como seria a Barra sem a praça Melo Uchoa? Talvez tivesse outra, mas, não tão linda como a Melo Uchoa. Que tem seu charme, seu encanto e sua beleza, cujo nome leva o do fundador da cidade.
            Com tantos atrativos ela ganhou frequentadores habituais, gente de todas as raças e cores, gente que ama e que deseja uma Barra do Corda melhor.

*Márcio Melo é barra-cordense, que atualmente mora e trabalha em Brasília

 

 

Idade das trevas
jornal Turma da Barra


*Murilo Milhomem


            Neste domingo, a Barra completa mais um aniversário. Não há quase nada a comemorar. São 174 anos de abandono e descaso. Inexistem políticas voltadas para a melhoria da qualidade de vida da população e geração de emprego. Resultado: grande emigração para centros mais desenvolvidos. Sempre foi assim e será.
            Quando desembarcou na terra, Melo Uchoa deparou com um precioso garimpo. Encontrou aquilo que mais faltava no seu estado: a água. Desde então, sempre que a seca aperta no Ceará, é para a região que o sertanejo se desloca.
            Basta dar uma pesquisadinha no tronco velho da maioria das famílias cordinas para constatar o óbvio. Meus bisavós, pelos dois lados, vieram de Icó e Barbalha. Vieram tangidos pela seca que atingiu o Ceará no ano de 1877. Se estabeleceram no povoado São Joaquim dos Melo, para trabalhar na labuta da terra.
            De lá para cá, quase nada mudou. Ano após ano, os filhos da terra continuam a botar o pé na estrada. Seguindo o exemplo dos meus bisavós há mais de cem anos, meus pais tiveram também de partir.
            Partem mais não voltam, porque a realidade local continua adversa. Quantos não gostariam de compartilhar os conhecimentos obtidos com os irmãos que ficaram. São impedidos, no entanto, pela miopia daqueles que comandam o destino da nossa gente sofrida.
            Por mais de mil anos, durante a idade média, o mundo ocidental teve de conviver com atraso similar, provocado pela miopia do clero, que então reinava sobre tudo e sobre todos. Quando Galileu ousou a afirmar que o sol (e não a terra) era o centro do universo, foi ameaçado de ser queimado vivo numa fogueira pela igreja.
            174 anos já se passaram e a Barra não mudou. Será que teremos de aguardar mil anos para que isso aconteça. A impressão que fica é que a Barra parou no tempo. A cidade cresceu em tamanho (os problemas também), mas a mentalidade dos dirigentes diminuiu.


*Murilo Milhomem é jornalista, mora em Brasília

 

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